
Quando se observa Campo de Ourique a partir de imagens de satélite, salta ao olho uma mancha verde, no centro da freguesia. Ali, no quadriculado do bairro que foi desenhado à semelhança da Baixa Pombalina, há um quarteirão que é uma mancha verde. Para quem vive no bairro, não há necessidade de olhar para mapas. O Jardim Teófilo Braga, mais conhecido como Jardim da Parada, é mesmo o centro da vida da freguesia e uma espécie de oásis no meio da densidade urbana e de construção que o rodeia.
Para debaixo do jardim, está prevista a construção, até 2026, da estação de metro de Campo de Ourique, no âmbito da expansão da Linha Vermelha do Metropolitano de Lisboa. A mudança, porém, não tem sido recebida de forma consensual. Um movimento de moradores diz-se contra a obra, mas surge agora um outro, que quer fazer da chegada do metro oportunidade para o crescimento do jardim e para a melhoria do espaço público da freguesia.
O processo de construção, com duração superior a dois anos, motivou receios de “amputação” do jardim. Foi esse medo que levou à criação de um movimento e de uma petição em defesa de uma outra localização para a estação de metropolitano. Mas este medo pode, afinal, ser infundado.
Agora, um grupo de cerca de duas dezenas de fregueses, também em defesa do jardim e do espaço público da freguesia, apresenta uma outra proposta. Querem o metro ali mesmo, no centro da freguesia, tal como está previsto, com uma pequena alteração: propõem um desvio de seis a sete metros da estação.
Assim, dizem, o poço de ataque da obra pode deslocar-se para a zona atualmente ocupada pelos sanitários públicos do jardim. Deste modo, diminui a área de estaleiro situada no jardim, que passa a ocupar parte da rodovia. Para além da minimização do impacto das obras, o grupo tem um outro objetivo: transformar o jardim numa superilha urbana, eliminando o trânsito à volta e fazendo-o crescer até às fachadas dos prédios. Ao todo, apresentam 12 medidas.

Metro: “uma oportunidade para ter um bairro muito mais verde”
Num vídeo recentemente divulgado pelo movimento Salvar o Jardim da Parada, é pedida outra localização para a estação de metro, “para que não se condenem as 118 árvores, algumas centenárias”, acrescentando-se que “a construção da estação de metro e a instalação do estaleiro de obras serão o fim do jardim como o conhecemos, acabando com o melhor e único espaço de convívio para todas as idades no bairro”.
Rita Castel’ Branco, arquiteta, urbanista e especialista mobilidade urbana considera que tem vindo a ser criada “a ideia de que o jardim está em causa”. “Está a haver alguma desinformação, medo nas pessoas – muita gente acredita que se quer destruir o jardim e as árvores centenárias”. Mas não é verdade, assegura.
O que está previsto é a ocupação parcial e temporária do jardim com o estaleiro da obra. Segundo o próprio Metropolitano de Lisboa, o estaleiro implicaria o abate de 11 árvores, nenhuma delas centenária.
Rita pertence ao grupo de 21 cidadãos que assinam a petição Metro no Jardim da Parada: Minimizar Impacto + Potenciar Oportunidades e é a única que não vive no bairro. Mas vive-o. “Tenho aqui imensos amigos e passo cá a vida”, diz.
Na manhã desta segunda-feira, o Jardim da Parada apresentava vida. A esplanada repleta de pessoas e de conversas que enchem o espaço. Há quem se passeie pelos caminhos do jardim, há crianças a brincar no parque infantil e muitos dos bancos estão ocupados, à sombra das árvores.
Na esplanada do quiosque, está Rita, mas também Filipa Pinto da Silva, moradora no bairro, e Jorge Farelo, arquiteto, freguês de Campo de Ourique e, diz-nos, alguém que gosta de andar a pé pelas ruas do bairro.

Jorge Farelo leu todos os documentos relativos ao projeto, incluindo as 800 páginas da avaliação de impacte ambiental e lamenta a ideia que tem vindo a tomar conta da contestação em torno da obra do metro. “Eliminar o jardim. Aquilo não é eliminar o jardim. Antes pelo contrário, é a oportunidade de [lhe] dar outro vigor”.
“A maior parte das pessoas acha que as saídas do metro são efetivamente aqui”, diz Filipa, referindo-se ao Jardim da Parada. Na verdade, apenas os elevadores da estação estarão localizados no jardim. As duas escadarias de acesso à estação deverão situar-se, de acordo com o projeto atual, junto da biblioteca Cinema Europa, na Rua Francisco Metrass, e no cruzamento da Rua Almeida e Sousa com a Rua Ferreira Borges.


Para Rita, compreende-se que a estação de Campo de Ourique seja no coração da freguesia. “Deslocar a estação é deslocar a sua capacidade de captação”, afirma. Construir a estação junto à Igreja de Sto. Condestável ou na Praça São João Bosco, junto do cemitério e terminal do elétrico 28 – algumas das localizações propostas pelo movimento que se opõe ao metro no jardim -, significa apanhar “uma grande parte [do território] que não é denso”.
Deslocar a estação seis ou sete metros para ocupar menos jardim e salvar árvores
Fora da Ferreira Borges, a larga e viçosa rua do bairro, que o percorre de ponta a ponta, é difícil encontrar árvores. Talvez por isso, o Jardim da Parada seja vivido pela população local, de 22 mil habitantes, como a grande centralidade do bairro. Local de passagem e paragem, local de conversa dos adultos e brincadeira das crianças, o jardim é um dos maiores motores para a criação de comunidade na freguesia e, talvez por isso, a chegada do metro seja motivo de tantos receios.

Após a auscultação da população local, que contesta os potenciais impactos da obra sobre o jardim, um dos únicos espaços verdes da densa e viva freguesia lisboeta, o Metropolitano de Lisboa procedeu a uma readaptação do projeto. Previa-se, inicialmente, a abertura de dois poços de ataque – buracos de obra à superfície, através dos quais são retirados a rocha e demais resíduos resultantes da escavação dos túneis. Isso significava o encerramento de uma parte considerável do jardim através da montagem de dois estaleiros, um em cada ponta do jardim. Agora, será apenas um. Acrescendo a esta alteração, a deslocação proposta da estação em seis ou sete metros, o espaço ocupado pelo estaleiro no jardim será ainda menor.


O grupo de fregueses sublinha o facto de estar a trabalhar com os dados existentes e propõe que o estaleiro “passe a funcionar na rodovia”, diminuindo a área ocupada no jardim. O projeto atual, tal como foi apresentado pelo Metropolitano de Lisboa, coloca todo o estaleiro da obra no jardim.
“Alguém achou que era melhor ocupar o jardim do que incomodar o tráfego e o estacionamento”, afirma o arquiteto Jorge Farelo, um dos signatários da petição que agora circula e que reúne, já, mais de 400 assinaturas.
As obras do metro como “pretexto” para fazer o jardim crescer
Ao invés de eliminar o jardim, Rita acredita mesmo que a obra do metro é “o pretexto” para fazer o jardim crescer e “uma oportunidade para ter um bairro muito mais verde”. “Este jardim é muito vivo, por isso é que é importante alargá-lo”, diz. Fazê-lo estender-se até às fachadas dos edifícios significa quase duplicar a sua área, passando dos atuais 5450 metros quadrados de espaço público para 9700 metros quadrados de jardim.
O crescimento do jardim “não tem de esperar” pelo fim das obras do metropolitano, acrescenta Filipa Pinto da Silva. Se a proposta for aceite, expansão do jardim para as suas laterais pode acontecer durante a obra, conquistando-se, desde já, “mais espaço público” para a freguesia.
Paralelamente, o grupo reforça a sua proposta de minimização dos impactos das obras com a sugestão de criação de “espaços públicos alternativos” e com o aumento da oferta de estacionamento. As duas devem ser concretizadas antes do início da empreitada, sublinham.
O grupo aponta para as zonas envolventes à Igreja de Sto. Condestável e a Praça Afonso do Paço como dois locais que devem ser “transformados em espaços públicos de lazer, com parque infantil e sombra”, apontando ainda para a concretização de dois investimentos na criação de estacionamento já anunciados: o silo previsto pela EMEL para o Pátio das Sedas, com cerca de 600 lugares, e a criação de 80 lugares de estacionamento na Travessa Bahuto.
Criados os novos espaços de lazer, deslocado o estaleiro e reforçada a oferta de estacionamento, a obra do metropolitano poderá arrancar com impacto minimizado, diz o grupo de fregueses.

A chegada do metropolitano a Campo de Ourique é, diz Jorge Farelo, uma “grande oportunidade de fazer uma intervenção que vai constituir outro quotidiano”. Quando a escola termina, o arquiteto vê o jardim encher-se de crianças. Uma “praga das boas”, diz Rita. E serão as crianças e os idosos do bairro os mais beneficiados com o alargamento do jardim, garante. Com a expansão do jardim, poder-se-á “tirar a cerca ao parque infantil”. O grupo de moradores quer que “os pais não tenham medo que as crianças estejam a correr por ali”.
Rita sublinha a oportunidade presente através da memória da transformação do espaço público na Avenida Duque de Ávila, por ocasião da expansão da Linha Vermelha ao Saldanha e a São Sebastião. “A Duque de Ávila só é aquele espaço público com nove metros de largura porque existiu uma obra do metro”. Sem as obras do metropolitano, diz, aquela avenida não teria assistido à expansão dos passeios, nem à criação de dezenas de esplanadas e de uma ciclovia.
De acordo com a proposta dos munícipes, a expansão do Jardim da Parada vai levar a “pequenos cortes [na circulação automóvel] à volta do jardim”, mas sem “grandes constrangimentos”, já que “todos os sentidos de trânsito” se mantêm exatamente iguais.
De Barcelona para Lisboa: Uma superilha urbana em Campo de Ourique
O trânsito deixa de atravessar o jardim, mas as ruas à volta continuam a permitir, de acordo com o esquema proposto, a passagem de automóveis pelos quatro cantos do quarteirão. Tal deverá conduzir a uma diminuição do tráfego nas proximidades.
As oito ruas que cruzam os cantos do jardim “passam a ser só de acesso local e tornam-se ruas de coexistência e de prioridade ao peão”, explica. “Tudo isto passa a ser uma zona altamente segura. Não estamos só a aumentar o espaço, estamos a fazer com que as crianças possam correr livremente sem uma hipervigilância constante dos pais”.

A proposta consubstancia, na prática, a criação de uma superilha urbana, conceito urbanístico criado em Barcelona e que consiste em criar percursos descontínuos para os automóveis nas ruas em redor de um quarteirão, dificultando a passagem de veículos que tenham outros destinos através da colocação de mobiliário urbano e árvores, por exemplo. A aplicação deste conceito leva à reconquista de espaço para usufruto público.
É a lógica da primazia ao peão que este grupo de moradores aqui pretende implementar, pela primeira vez em Lisboa. As oito ruas à volta do jardim devem, assim, “ser requalificadas e ter um caráter pedonal”.
“A partir do momento em que se propõe tirar o trânsito à volta do jardim, automaticamente estes troços de rua que nele convergem secam e, se calhar, passam a ter 10% do tráfego que têm neste momento. Só passa ali quem vem estacionar”, explica Rita Castel’ Branco. Os automóveis “deixam de atravessar” a zona. “No fundo”, diz, apesar de se manter o estacionamento, “os carros são visitantes e o espaço é pedonal”.
Filipa acredita que a expansão do jardim e a implementação da primeira superilha urbana em Lisboa tem “o potencial de ser um case study e um excelente exemplo” para as outras freguesias da cidade. No final do passado mês de agosto, o grupo reuniu com a Junta de Freguesia de Campo de Ourique para apresentar a proposta, que terá sido “bastante bem” recebida.
Ainda por ocasião das obras do metropolitano, o grupo sugere que seja considerada a sobrelevação de alguns cruzamentos do bairro como medida de acalmia de tráfego, incluindo a colocação de árvores no espaço conquistado aos automóveis. “Ao contrário daquilo que muita gente possa imaginar”, afirma Rita, “Campo de Ourique destaca-se pelo número de atropelamentos, muitos fruto de carros parados nas esquinas”.

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Frederico Raposo
Nasceu em Lisboa, há 30 anos, mas sempre fez a sua vida à porta da cidade. Raramente lá entrava. Foi quando iniciou a faculdade que começou a viver Lisboa. É uma cidade ainda por concretizar. Mais ou menos como as outras. Sustentável, progressista, com espaço e oportunidade para todas as pessoas – são ideias que moldam o seu passo pelas ruas. A forma como se desloca – quase sempre de bicicleta –, o uso que dá aos espaços, o jornalismo que produz.
✉ frederico.raposo@amensagem.pt
A proposta de 20 pessoas de campo de Ourique, ha,ha,ha,ha,ha!!! De 22000 habitantes de campo de Ourique só 20 é que propõem esta alteração???!?!?!!!!,ha,ha,ha,ha,ha😅🤣😅😂😂🤣🤣😅😅😅😅😅😅🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣 b-b-b-boa sorte……
Aumentar o Jardim ?? …. SIM !!!
Construir a Estação de Metro no Jardim…. NÃO !!!
Como já exprimi em outros locais, dei como exemplo a Cidade de Londres, que tem imensas Estações de Metro, tendo por cima Prédios de Habitação ou Escritórios.
Basta arranjar um Terreno, ou um ou mais Prédios devolutos, construir a Estação e depois Edificar o Prédio no fim. Foi assim que fizeram em Londres. Esta página não permite Fotos, mas se assim entenderem, enviarei Fotos a comprovar.
Este grupo não quer preservar o actual jardim com as frondosas árvores centenárias que capturam muito do CO2 existente. Deixar destruir com a construção da estação de metro, para depois criarem o seu proprio projecto. Triste…