“Saquei os argumentos de Tarantino todos da internet”, disse Jorge Costa com vaidade. “Eu também”. Foi assim, na primeira conversa entre os dois, que Nuno Markl, radialista e humorista, percebeu que um homem como ele, amante de cinema e de música, também poderia ser vítima de uma intempérie tão grande que o fizesse desaguar na rua, como sem-abrigo. Homens como ele, colecionadores de argumentos dos maiores clássicos, poderiam estar atrás dos rostos que tantas vezes ignoramos na rua e que tantas vezes nos pedem auxílio.
Foi a maior lição que Jorge Costa, que morreu em abril deste ano, deixou a quem se cruzou com as suas crónicas na Mensagem, desde que foi desafiado a escrever um diário sobre os oito meses que passou na rua, com e sem pandemia.
A apresentação decorreu no centro de acolhimento Santa Bárbara. Na última fotografia, parte da equipa da Mensagem, com Nuno Markl e duas amigas de Jorge Costa, Teresa Bispo e Isabel Carlos. Fotos: Inês Leote
Crónicas que deram um livro, “Diário de um Sem-abrigo – Os dias (e noites) de Jorge Costa a viver nas ruas de Lisboa”, lançado esta quinta-feira no Centro de Alojamento de Emergência de Santa Bárbara, em Arroios, com capacidade para receber mais de 100 pessoas em situação de sem-abrigo. Um lugar simbólico, próximo daqueles que, como Jorge, perderam o teto.
Pode rever a cerimónia de lançamento aqui.
O livro, editado pela Oficina do Livro (chancela da editora LeYa) junta os 14 relatos deste homem, há não muito tempo um funcionário da área da contabilidade numa empresa que, entretanto, abriu falência. Foi apenas um estalar de dedos até deixar de ter dinheiro para uma renda, para comer, para água, e terminar num banco do Parque das Nações.
Na apresentação, esteve Nuno Markl, de quem Jorge Costa era fã e que passou ele mesmo a ser fã de Jorge também. Assina, juntamente com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o prefácio deste livro. Marcaram também presença Laurinda Alves, vereadora dos Assuntos Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, e o vereador Diogo Moura, com o pelouro da Cultura. Assim como Rita Fazenda, editora do livro, e Catarina Carvalho, diretora da Mensagem, para contar como surgiu este convite a Jorge Costa, que viria a tornar-se cronista do jornal no início de 2021.
A sala encheu ainda com duas presenças especiais de mulheres albergadas no centro de Santa Bárbara, para ler excertos do livro. A escolha deste local para a apresentação da obra e a presença de quem vive o que Jorge viveu fazia parte da missão dele com estas crónicas, “fazer-nos olhar mais para os outros”, lembrou Catarina Carvalho.
O livro está desde 14 de junho à venda nas livrarias, com um PVP de 10,90€. Os resultados das vendas irão reverter para uma Bolsa de Jornalismo sobre Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, na Mensagem.

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Para Lisboa ser melhor para as pessoas na condição de sem-abrigo, era não lhes tirarem as casas nem o emprego mas para isso, não tenho espaço suficiente para comentar. Ainda bem que há solidariedade mas é muito mais bonito não vir atrelada com nomes sonantes. Quanto muito, com quem fez a diferença para essas pessoas, que amanhã podem ser qualquer um de nós…