Estação do Rossio. Foto: Rita Ansone

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Após anos de reivindicações políticas e populares, Loures pode mesmo vir a ter comboio a ligar o concelho ao centro de Lisboa em apenas “dez ou 15 minutos”. Esta é apenas uma das propostas do Plano Ferroviário Nacional, apresentado esta quinta-feira.

O plano, com horizonte temporal até 2050, prevê vários investimentos na ferrovia com impacto em Lisboa e na sua área metropolitana. A estação do Alvito, em Alcântara, poderá vir a abrir ao serviço de passageiros e Setúbal pode vir a ficar a apenas 30 minutos de distância.

O plano, que segundo o primeiro ministro deverá funcionar como “bússola” para o investimento ferroviário em Portugal, não vai dar frutos para já. Pensado até 2050, o Plano Ferroviário Nacional foi dado a conhecer ontem e revela uma grande aposta na ferrovia para a Área Metropolitana de Lisboa (AML) e nas ligações de Lisboa ao norte e ao sul do país, bem como à capital espanhola. Tudo com o objetivo de reduzir a dependência automóvel e diminuir as emissões de gases com efeito de estufa.

Em todo o país, é objetivo nacional fazer crescer a quota modal do transporte ferroviário para 20% até 2050, quando em 2019 se situava apenas nos 4,6% (na União Europeia, a média era de 8%).

É em Lisboa, contudo, que a utilização do comboio tem a sua maior expressão a nível nacional. Segundo dados avançados na apresentação do plano, do total de 175 milhões de viagens de comboio feitas no país, 134 milhões acontecem nos comboios suburbanos de Lisboa, cerca de 77% do total nacional, dada a maior abrangência da rede na AML.

A utilização do comboio em Lisboa tem, aliás, mostrado sinais positivos. Antes da pandemia, e após a entrada em vigor do Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos (PART), que simplificou e reduziu drasticamente o valor dos títulos mensais de transporte público, o número de passageiros transportados pelos comboios suburbanos de Lisboa subiu 23,4% em apenas um ano – entre 2018 e 2019 -, para 133,7 milhões de passageiros.

Uma nova ponte sobre o Tejo e comboio em Loures

Interface Sete Rios EMEL Restart Rede Expressos Terminal Rodoviário Comboio Autocarro Turistas
Comboio Fertagus, em Sete Rios. Foto: Inês Leote

São várias as apostas previstas para a rede ferroviária da área metropolitana. Apesar disso, o horizonte temporal para a sua concretização é alargado – quase três décadas – e muitos dos planos não passam, para já, de propostas abertas a discussão e ainda sem financiamento garantido.

“Há uma coisa com que temos de nos congratular que é haver um plano ferroviário ao fim de 80 anos”

Manuel Tão

Manuel Tão, especialista em ferrovia, transportes e planeamento regional, congratula-se com o facto de “haver um plano ferroviário ao fim de 80 anos”, mas assume uma dose de ceticismo no que respeita à concretização de todas as propostas lançadas pelo plano nacional, que agora entra em fase de discussão pública.

O especialista destaca a existência de “dois problemas” fundamentais no Plano Ferroviário Nacional:

  • Por um lado, a falta de um plano diretor financeiro, detalhando “tudo aquilo que seriam os fundos previstos a nível dos sucessivos orçamentos do Estado, quer a nível dos fundos comunitários disponíveis, quer ainda do modelo de negócio que se preconiza para cada uma das [propostas]”.
  • Por outro, denuncia a falta de “uma definição clara dos timings para cada uma” das propostas, apelando, assim, ao exercício de “cautela” e “reserva” quanto à efetiva materialização das intenções tornadas públicas esta quinta-feira, numa apresentação que contou com a intervenção de Pedro Nuno Santos, ministro das infraestruturas e da habitação, e de António Costa, primeiro ministro.

Dois dos maiores investimentos com impacto na mobilidade em Lisboa são a construção da Terceira Travessia do Tejo (TTT), entre Chelas e Barreiro, e a criação de um novo acesso da Linha do Oeste a Lisboa. Esta última proposta permitiria a chegada de passageiros vindos de Loures ao centro de Lisboa em cerca de 10 a 15 minutos e resultaria na diminuição dos tempos de viagem entre Lisboa e concelhos como Caldas da Rainha e Torres Vedras, que passaria a ficar a apenas 40 minutos da estação Lisboa-Oriente. Atualmente, o tempo de viagem mais curto entre as duas estações é de cerca de uma hora e meia.

A azul, a nova ligação proposta da Linha do Oeste a Lisboa. Fonte: Plano Ferroviário Nacional

Com a diminuição dos tempos de viagem, Torres Vedras tornar-se-ia “numa extensão do mercado imobiliário e turístico de Lisboa”, intensificando-se as deslocações entre as duas cidades e promovendo “uma nova repartição modal em que pode perspetivar-se a transferência de viagens de automóvel para viagens de comboio”, afirma Manuel Tão.

O aumento do peso da ferrovia nas deslocações é mesmo um dos grandes objetivos da aposta prevista pelo Plano Ferroviário Nacional, com o objetivo de diminuir o número de automóveis a entrar nos perímetros urbanos e de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa.

Recorde-se que, segundo o Roteiro para a Neutralidade Carbónica, a meta traçada para a redução das emissões provenientes do setor dos transportes é de 98% até 2050, face a valores de 2005, e de 43% até 2030.

Para o especialista em ferrovia, a grande dúvida suscitada pelo anúncio deste novo troço prende-se com a inserção deste na Linha de Cintura, em Lisboa, que terá de ser concretizada, diz, em túnel de “seis ou sete quilómetros”, atravessando a cidade, até ligar com a rede de comboios suburbanos de Lisboa.

O novo troço de ligação à Linha do Oeste, para além de procurar materializar a reivindicação política e popular que há muito pede a chegada do comboio a Loures, permitiria “corrigir” aquele que para Manuel Tão é um “erro crasso”: a linha circular do metropolitano, agora em execução, que “amputa” a ligação direta de Odivelas ao centro da cidade e à Linha de Cintura, que acontecia no interface multimodal de Entrecampos.

Uma nova estação de comboios em Alcântara e Setúbal em 30 minutos

A nova ponte sobre o Tejo, entre Chelas e Barreiro, prevê a criação de quatro vias férreas – duas destinadas à circulação de serviços suburbanos e outras duas destinadas a comboios de longo curso – e, uma vez concretizada, possibilitará cortar em metade o atual tempo de viagem entre Lisboa e Setúbal. Atualmente com duração de uma hora, passaria a poder realizar-se a viagem em cerca de 30 minutos.

A rede ferroviária proposta para a Área Metropolitana de Lisboa (AML) até 2050. Fonte: Plano Ferroviário Nacional

Frederico Francisco, coordenador do grupo de trabalho para o Plano Ferroviário Nacional, avançou, na apresentação do plano, que a Terceira Travessia do Tejo permitiria “um serviço muito mais frequente”. Atualmente, a frequência das ligações Lisboa – Setúbal é de um comboio por hora. Com a nova ponte, avança, poderão realizar-se “quatro, cinco, seis, comboios por hora” e o tempo de viagem passará a ser de apenas meia hora.

Manuel Tão acredita que a melhoria da frequência e a diminuição no tempo de viagem representam um “potencial de transferência de viagens de carro para viagens de comboio”. Não apenas para quem se desloca de e para Setúbal, diz, mas também para quem vem de localidades como Pinhal Novo, Palmela e Barreiro.

Para além da construção de uma nova ponte, as ligações entre Lisboa e a margem sul deverão também sair reforçadas através da Ponte 25 de Abril. De acordo com os planos apresentados, a estação do Alvito, em Alcântara, deverá abrir, por fim, ao serviço de passageiros.

Ali desde que o comboio começou a circular pela ponte, em 1999, a estação do Alvito nunca abriu ao serviço de passageiros. Situa-se, contudo, numa localização privilegiada e no centro de um conjunto de investimentos anunciados para a rede de transportes públicos de Lisboa. Dali deverá partir o LIOS Ocidental, uma linha de elétrico – ou metro de superfície -, até Linda-a-Velha, passando pela Ajuda, Restelo e Miraflores. Adicionalmente, a linha vermelha do Metropolitano de Lisboa deverá ali chegar até 2026.

Com a chegada do metro e com a criação da nova linha de metro ligeiro de superfície ali, Manuel Tão perspetiva para a eventual abertura da estação de comboios do Alvito “um papel similiar àquele que o Pragal tem com o metro da margem sul. O Alvito tornar-se-ia um distribuidor logo à saída da travessia do Tejo pela Ponte 25 de Abril. Teríamos algum descongestionamento, quer de Campolide, quer de Sete Rios, porque teríamos mais um ponto distribuidor”.

A vermelho, a estação do Alvito, em Alcântara, na rede ferroviária proposta para a AML. Também visível, a ligação da Linha de Cascais à Linha de Cintura, através da estação Alcântara. Fonte: Plano Ferroviário Nacional

Ainda dos planos apresentados ontem, volta a constar um investimento que o especialista considera que já deveria estar executado. Trata-se da ligação da Linha de Cascais à Linha de Cintura, obra a executar precisamente junto à estação do Alvito.

“É um projeto que já tem barbas. É daquelas coisas que não é para amanhã, é para anteontem”, diz. Já prevista pelo PNI 2030, a empreitada está orçada em 200 milhões de euros e deverá materializar-se entre 2023 e 2027, embora os desenvolvimentos no processo tardem.

Segundo o proposto, a atual estação Alcântara-Terra deverá desaparecer, dando lugar a uma nova estação, subterrânea e “tipo metro, com uma concordância à Linha de Cascais”.

Ligações mais rápidas ao resto do país e alta velocidade até Madrid

O Plano Ferroviário Nacional tem o objetivo de repor a existência de ligações ferroviárias às dez maiores cidades do país. Viseu, Vila Real e Bragança permanecem as únicas três capitais de distrito sem ligação ferroviária, facto que o plano nacional pretende alterar.

Com a criação de uma nova linha, Lisboa passará a contar, por fim, com uma ligação ferroviária de alta velocidade a Viseu, com um tempo estimado de viagem de uma hora e 20 minutos.

A Terceira Travessia do Tejo possibilitará, ainda, a redução dos tempos de viagem entre Lisboa, Évora, Beja e Faro. A distância entre Lisboa e Faro, poderá, em função das opções propostas pelo plano, passar a ser percorrida em menos de duas horas.

No largo horizonte temporal definido pelo Plano Ferroviário Nacional – até 2050 – está previsto que a viagem Lisboa – Madrid tenha a duração de cerca de três horas.

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Frederico Raposo

Nasceu em Lisboa, há 30 anos, mas sempre fez a sua vida à porta da cidade. Raramente lá entrava. Foi quando iniciou a faculdade que começou a viver Lisboa. É uma cidade ainda por concretizar. Mais ou menos como as outras. Sustentável, progressista, com espaço e oportunidade para todas as pessoas – são ideias que moldam o seu passo pelas ruas. A forma como se desloca – quase sempre de bicicleta –, o uso que dá aos espaços, o jornalismo que produz.

frederico.raposo@amensagem.pt

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3 Comentários

  1. De acordo com este plano ferroviário e se o projeto da linha vermelha do metro avançar sem alterações , em Alcântara passaria a existir uma estação de comboio enterrada e uma estação de metro sobreelevada, que originalidade!

  2. Além da incongruência e incoerência de não apresentar um modelo de ordenamento do território sustentável e resiliente, tudo o mais, serve para integrar-se no RCSR (Rescaling Competition State Regime), evidenciando-se como a terceira versão do famigerado PETI3+ do período da Troika. O dito veio à luz, após 1 ano da data anunciada (nov.2021), com os desperdícios do costume (mais betão e menos tecnologia, ex: Cascais/Cintura; Interfaces; 3ª travessia do Tejo; LAV Lisboa/Porto, etc.) e sem planeamento estratégico (cenários macroeconómicos e custos? avaliação de modelo de ordenamento do território? planos deslocações urbanas regionais e urbanos? conta pública do sistema de deslocações?…) e sem programa de acção por redes em cada região e sub-região (ex: como integrar a Linha da Lousã, a Linha do Douro, a Linha do Alentejo, etc.), não ajudando em nada a resolver os problemas associados aos milhões de deslocações diárias de passageiros e mercadorias mas, acima de tudo, sem um programa imediato de inovação tecnológica no sistema de exploração e correcção das linhas desafectadas nestes últimos anos (ex: Linha da Lousã). De facto, ao longo destes dois anos, a Democracia ficou suspensa e o que aí vem, mostra, mais uma vez, que não têm aprendido nada com as boas práticas existentes em países que cumprem mais a Convenção de Aärhus.

  3. Vão acreditando Vão, acreditem nestas coisas como se fossem chapas de lei. Eu acho impressionante como é que o português, à tantos anos a levarem chapadas do governo com promessas e promessas, obras e obras, ainda conseguem ser tão burros e acreditarem nestas coisas todas. Irra….

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