Hugo, Inês, Ruben, Fernanda, Gonçalo, Carolina. Todos abaixo dos 18 anos. Todos nascidos e criados no bairro do Rego, nas Avenidas Novas, em Lisboa. Todos igualmente distantes do mundo mediático e jornalístico. Acedem às notícias pelas redes sociais – como a maioria dos jovens de todo o mundo (foi isso mesmo que o último estudo do Reuters Institute, realizado em março, mostrou – “para os jovens, as notícias não são apenas digitais, são sociais”). Tal como os jovens que o estudo focava, “cresceram com a rede social, participativa e isso condicionou a forma como consomem informação, o que consideram ser as notícias, e em quem confiam para as dar”.

Para estes jovens, o que é o jornalismo? Algo distante, que raramente espelha as suas preocupações.

Mas será mesmo assim? E se o jornalismo fosse uma arma que eles podiam usar para “ter uma voz mais forte”?

Habituados a morar num bairro tantas vezes fora do radar das preocupações do resto da cidade e dos media, estes jovens serão agora desafiados a tomar as rédeas. A serem eles os contadores de histórias. Das suas histórias.

A Mensagem de Lisboa juntou-se à Associação Passa Sabi para criar o projeto “Correspondentes de Bairro”. Inspirado nas tendências do jornalismo comunitário, criámos um processo de aprendizagem através do qual estes jovens serão levados pelo caminho dos media, aprenderão as bases da literacia mediática, serão formados em desinformação e acabarão por desfiar as narrativas jornalísticas – do texto ao vídeo, passando pelo áudio e redes sociais – à sua maneira.

O objetivo é ganharem a confiança e a experiência que lhes permitam contar essas histórias e a realidade que os rodeia e lhes interessa.

Todas estas histórias – editadas e curadas – serão publicadas na Mensagem de Lisboa. Histórias – das mais inspiradoras às mais complexas – que ninguém conta e que estão normalmente afastadas dos media tradicionais.

A iniciativa ganhou uma bolsa do Programa Cidadãos Ativ@s/EEAGrants, fundo gerido em Portugal pela Fundação Calouste Gulbenkian e pela Fundação Bissaya Barreto ao qual a Passa Sabi e a Mensagem concorreram.

O projeto será apresentado no dia 13 de outubro, na sede da Passa Sabi, num evento híbrido: será um conselho de vizinhos, um debate com vários cidadãos ativos e intervenientes-chave na cidade, e com uma cachupa no final. Estarão presentes no debate:

O projeto é financiado pelo Programa Cidadãos Ativ@s/EEAGrants, fundo gerido em Portugal pela Fundação Calouste Gulbenkian e pela Fundação Bissaya Barreto. Foto: Inês Leote

As sessões sobre jornalismo serão dadas pelos elementos da Mensagem, e as de desinformação serão coordenadas pelo jornalista Paulo Pena, especialista no tema e autor do livro Fábrica de Mentiras. Viagem ao mundo das fake news.

São coordenadoras do projeto Joana Mouta, da associação Passa Sabi, Catarina Carvalho e Catarina Reis, respetivamente diretora e jornalista da Mensagem.

“Neste projeto jovens e jornalistas vão criar juntos uma linguagem comum de partilha de informação, garantindo que a sua comunidade é efetiva e positivamente representada, procurando criar um espaço mediático acolhedor, inclusivo e, acima de tudo, consciente. Este projeto é fundamental, hoje, como força contrária ao discurso de ódio, racismo e xenofobia que grassa e que limita e cataloga pessoas e seus futuros sem a mínima lembrança de humanidade partilhada – e que é uma séria ameaça à democracia”, diz Joana Mouta, coordenadora da Passa Sabi.

Catarina Carvalho, diretora da Mensagem de Lisboa, explica que este projeto “se inspira numa tendência dos media internacionais de alargar o seu âmbito social e geracional: a comunidade e grupos sociais normalmente afastadas do centro, lugares onde não vamos, questões que nos escapam, mas são essenciais numa cidade que se quer para todos e de todos. A Mensagem de Lisboa, sendo jornalismo da cidade, tem essa responsabilidade: a de promover a empatia através do conhecimento.”

Afinal, “que vozes faltam no jornalismo em Lisboa? Como ouvir quem não é ouvido? E como conseguir a participação de quem vive longe dos centros de decisão da cidade?”, pergunta Catarina Reis, jornalista da Mensagem de Lisboa e corresponsável do projeto. “É alarmante como os meios de comunicação social deixam as gerações mais novas para trás. Não falam nem escrevem para eles, não se preocupam se são claros nem se, no final, estão a deixar estes cidadãos mais informados ou mais distantes. Já não é nos jornais que eles procuram notícias, muitos já nem as procuram e estão, por isso, mais sujeitos à desinformação”, remata.

Foi neste bairro que a Passa Sabi foi fundada, em 2014. Criou-se como uma associação sem fins lucrativos que visa realizar atividades culturais, sociais, económicas e desportivas, envolvendo a comunidade de forma a promover a sustentabilidade da comunidade e elevar e divulgar a cultura.

O bairro, situado na freguesia das Avenidas Novas, foi construído em 2001 no âmbito de um plano de realojamento municipal para dar novas habitações a famílias que antes moravam em bairros de autoconstrução.