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Esquerda, direita. Esquerda, direita. A pancada no couro preto e vermelho chega seca e com força. Quando Paulo agarrou pela primeira vez numas luvas de boxe, tinha ele oito anos, não sabia que poderia exercer tanta energia sobre os sacos pendurados no teto da academia onde tudo começou, capaz de os fazer abanar e mudar de direção. Nem nos sacos nem na vida dele, que cedo lhe prometeu duras marcas de combate.
Aquele menino nascido e criado no desmantelado Casal Ventoso encontraria no boxe “uma família muito especial”, a quem deve não ter ficado na rua quando perdeu a mãe, aos 14 anos, e ter aprendido a defender-se quando se tornou vítima de bullying, por conta do peso que tinha.
Era padeiro desde os 13 quando, em 1992, Paulo Seco conciliava as madrugadas em frente aos fornos besuntados de farinha e treinava os mínimos para os Jogos Olímpicos. Seria a oportunidade de gravar o nome dele na história do país.
O apuramento não aconteceu, mas este menino pugilista veio devolver o que melhor sabia fazer ao novo bairro dele, a Quinta do Loureiro, no Vale de Alcântara (para onde foi realojado depois do fim do Casal Ventoso). Na Academia Paulo Seco, tornou-se o treinador de campeões como o atleta Pedro Matos, fez do balneário o refúgio de muitos refugiados chegados a Lisboa e sem sítio para dormir, e ajudou Maria Barbosa a combater a dislexia.
Na arena da Quinta do Loureiro, Paulo ensina o respeito antes da técnica. E sabe que, em qualquer round, mostrar como se faz é muito melhor que apregoar.









Fotos: Rita Ansone
Esta reportagem faz parte da “Mensagem Rádio”, um programa que passa quinzenalmente na RDP África (do grupo RTP), à terça e sexta-feira, e em permanência: no site da Mensagem, em rdpafrica.rtp.pt e no Spotify.
Produção: Catarina Reis (Mensagem de Lisboa) e Isabel Leonor (RDP África)
Voz e edição: Catarina Reis

Catarina Reis
Nascida no Porto, Valongo, em 1995, foi adotada por Lisboa para estagiar no jornal Público. Um ano depois, entrou na redação do Diário de Notícias, onde escreveu sobretudo na área da Educação, na qual encheu o papel e o site de notícias todos os dias. No DN, investigou sobre o antigo Casal Ventoso e valeu-lhe o Prémio Direitos Humanos & Integração da UNESCO, em 2020. Ajudou a fundar a Mensagem de Lisboa, onde é repórter e editora.
✉ catarina.reis@amensagem.pt

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