Receba a nossa newsletter com as histórias de Lisboa 🙂
Árvores de fruto, couves a espreitar, um baloiço feito com um pneu e uma corda. Assim foi nascendo a horta escolar da EB1/JI Santo António, em Alvalade. Uma horta pela qual Catarina Raio, Juliana Barbosa e Inês Sequeira, mães com um papel ativo na comunidade escolar, sempre lutaram. É que esta não é só uma horta de cultivo: “É uma sala de aula”, diz Catarina Raio. Aqui aprendem-se os ditongos em Português (morangueira, macieira…) e até mesmo os nomes dos frutos em Inglês.
A Escola EB1/JI Santo António remonta ao início do bairro de Alvalade, e por isso denuncia já a passagem do tempo. Há cerca de quinze anos que já se fala num projeto de reabilitação do edifício. Finalmente essas obras arrancaram, com a promessa de mais condições de segurança, um pátio no jardim de infância, uma biblioteca, um novo refeitório. Uma obra que todos os pais consideraram positiva, até que o medo se instalou na comunidade escolar: o que seria feito da horta?

Há quatro anos, falara-se na sua destruição. Entretanto, as únicas plantas que chegaram às mãos dos pais, professores e alunos diziam respeito aos arranjos interiores da obra. Numa das plantas, estava prevista a construção de laboratórios e de um “centro de educação ambiental” num velho edifício ao lado da horta, mas não havia nenhuma informação para além dessa. Foram enviados e-mails por parte dos pais para a Câmara a pedir detalhes, mas ficaram sem resposta.
Porém, a Câmara Municipal de Lisboa respondeu à Mensagem. Embora a horta não se encontre contemplada nas plantas, o seu espaço está a ser tido em conta na empreitada, tendo a designação “Horta Campo” e “solo/horta”, segundo explicou a CML.

A horta escolar
Desde que as obras arrancaram, há cerca de um mês, que os alunos não voltaram ao espaço da horta, onde dantes tanto aprendiam ao ar livre.

É um espaço importante para todos, e daí o medo: em 2016, o terreno que era já uma horta foi dinamizado graças a uma parceria entre a Associação de Pais e a Horta FCUL e com o apoio do programa estímulo à aprendizagem da Gulbenkian. Ervas aromáticas, composto urbano, um sistema de rega: algumas das inovações ali introduzidas.
Deu-se vida à horta, tornando-a num espaço para alunos, professores e pais, e que em muito contribuiu para que esta escola se tornasse numa Eco-Escola por dois anos consecutivos através de um programa internacional que reconhece o trabalho desenvolvido pelas escolas no âmbito da sustentabilidade.
Marie, filha de Juliana Barbosa, tem nove anos e já tem saudades da horta. “Aquela é uma horta que tem plantas e que foi planeada, está tudo perfeito”, conta. “Esta horta faz parte da infância das crianças”, apela Juliana Barbosa. “Nem todas as escolas têm um espaço tão grande, e isto faz parte do processo educativo, da relação que as crianças constroem com a natureza e com o futuro”.
Da escola para a Assembleia Municipal

A horta não foi o único problema desta empreitada, tal como se vê logo no portão da escola, onde está afixado o seguinte aviso: “Intervenções no Arvoredo: por motivo de obras dentro desta escola, serão transplantadas 33 árvores e serão removidas 28. No âmbito da obra serão replantados novos exemplares de árvores e arbustos”.
“A retirada de tantas arvores é um péssimo exemplo que estamos a dar às crianças”, diz Juliana Barbosa, que se mobilizou de imediato, promovendo um abaixo-assinado contra a remoção e a transplantação das árvores.
Segundo a Câmara Municipal de Lisboa, serão abatidas 28 árvores e transplantadas 33, mas serão também plantados 63 arbustos. Mesmo assim, a quantidade de arvoredo que será removido foi alvo de descontentamento por parte da comunidade escolar.
Juliana Barbosa e Inês Sequeira trouxeram estas preocupações à Assembleia Municipal, preocupações que foram entretanto recuperadas pelos deputados municipais Miguel Graça e Daniela Serralha, do Cidadãos por Lisboa, que propuseram as seguintes recomendações à Câmara Municipal de Lisboa:
- dar a conhecer à comunidade escolar o projeto de arranjos exteriores previstos para a escola;
- salvaguardar o maior número possível de árvores;
- preservar a horta coletiva existente;
- informar sobre onde se encontra o parque infantil que foi desmontado, e remontá-lo, ainda que provisoriamente, na EB 2,3 Eugénio dos Santos ou nas imediações de uma das escolas dos agrupamentos;
Aquilo que mais parece preocupar é, claro, a horta escolar, que tudo indica que vai manter-se. Ainda há dias, o filho mais velho de Juliana, que já deixou esta escola, regressou à horta onde ele próprio cultivou e ficou emocionado ao ver as árvores a darem fruto.
“Esta escola é especial”, diz Inês Sequeira, que a escolheu para as suas filhas exatamente por causa dos espaços verdes. “Queremos torná-la numa escola descaracterizada, com cimento e betão?”. Ainda sem se saber exatamente em que moldes se preservará a horta, os pais esperam que um dia os filhos regressem a esse espaço de aprendizagem.

Ana da Cunha
Nasceu no Porto, há 26 anos, mas desde 2019 que faz do Alfa Pendular a sua casa. Em Lisboa, descobriu o amor às histórias, ouvindo-as e contando-as na Avenida de Berna, na Universidade Nova de Lisboa.
✉ ana.cunha@amensagem.pt
Esta escola fica na rua Eugénio de Castro, ao lado de outra?
Sim, fica na rua Eugénio de Castro. Não sei de mais nenhuma escola nessa rua, só se se refere ao jardim infantil que está integrado na escola.