No protesto dos pais e alunos da Escola Básica do 1º Ciclo com Jardim de Infância Maria Barroso, junto ao que dantes era o Tribunal da Boa Hora, no Chiado, ouvem-se as razões do próprio protesto. Há o barulho das buzinas, e, apesar dos condutores pacientes, no caos instalado de uma quarta-feira de manhã de um outono recente, há desentendimentos. Como há sempre. A manifestação pretende chamar a atenção para a falta de segurança rodoviária em frente ao portão da escola, impensável numa zona tão central de Lisboa. As sucessivas tentativas de implementar medidas foram várias vezes ignoradas.

A preocupação em eliminar a circulação dos automóveis em frente aos portões das escolas tem-se tornado comum entre pais e alunos lisboetas. Tal como em Arroios e no Parque das Nações, também aqui, em Santa Maria Maior, se têm proposto iniciativas para a redução da circulação de automóveis. Semelhante à da Praça das Gaivotas, na zona oriental da cidade, a Associação de Pais da Escola Maria Barroso apresentou uma proposta ao Orçamento Participativo para que o Largo Boa Hora fosse, pelo menos durante o horário de funcionamento, para uso exclusivo das crianças.

Além do perigo da passadeira, a escola funciona ao lado de um dos parques de estacionamento subterrâneos do Chiado. Por isso, a proposta não foi aceite porque “o espaço deve manter-se público para usufruto de toda a população.” A Junta de Freguesia diz-se, no entanto, empenhada em concretizá-la.

A velocidade a que os carros circulam perto da escola Maria Barroso é uma das razões do protesto dos pais.

Mas, para Marta Paz, a vice-presidente da associação de pais, “as prioridades estão trocadas”: “A escola foi construída de raiz e, ao mesmo tempo, inauguraram um parque de estacionamento, o que torna a permanência nesta praça perigosa para as crianças. Poderia ser uma extensão da escola, mas com o parque, tudo se torna complicado e exige uma atenção redobrada em relação aos comportamentos das crianças”.

Menos transportes e mais espaços públicos

A filha de Marta anda no terceiro ano. As medidas a implementar, simples, reduziriam o risco drasticamente.

Os passeios nesta zona estão muitas vezes bloqueados com carros estacionados, trotinetes e caixotes do lixo, o que obriga os alunos a caminhar pelas estradas. “A Rua do Crucifixo tem passeios muito estreitos que estão várias vezes obstruídos. Esta é uma rua que tem mais circulação de peões do que carros, mas estes é que têm prioridade”.

Desde o ano passado que se discute a redução do número de carros, o aumento do espaço pedonal e a agilização da deslocação dos transportes públicos em várias ruas da Baixa e do Chiado, com a criação da zona de emissões reduzida, a chamada ZER. No entanto, devido à pandemia, estas obras foram adiadas. “É um problema grave. Discutimos bastante a questão do trânsito e do estacionamento, mas não tanto a segurança dos peões”.

Alertar para a falta de segurança na passadeira em frente à escola foi outro dos objetivos deste protesto.

O problema é o mesmo para todos: “Os carros não param na passadeira, é recorrente”, diz Vera Silva, que também participa na direção da associação. Foi por esta razão que durante quatro anos a Associação de Pais expôs consecutivamente em reuniões com a CML, a inexistência do sinal A14, que assinala locais frequentados por crianças e pediu que este fosse colocado.

Desde a inauguração deste estabelecimento de ensino, em 2017, que os pais apresentam propostas de medidas e projetos para diminuição dos limites de velocidade e requisitam a presença da Escola Segura nos horários de maior concentração de crianças, mas a resposta a estas preocupações e pedidos nunca chegou.

Susana Oliveira, sócia da associação de pais, afirma que a sinalização requisitada sempre esteve na Rua Nova do Almada, só que “a 80 metros da passadeira e virada para o lado de trânsito oposto”. A escola funciona nas instalações de parte do edifício do antigo Tribunal da Boa Hora, o que causa alguns constrangimentos organizativos e logísticos, como explicam Susana e Vera.

“Só é permitida a entrada dos alunos na escola após as 09h15, e mesmo na Componente de Apoio à Família só podem entrar entre as 08h00 e as 08h45. Todos os dias há uma grande aglomeração nesta praça, o que é perigoso devido ao parque de estacionamento e, como vimos, mesmo com o sinal, os carros continuam a não parar”. A solução, para Marta Paz, seria a criação de uma barreira física “que criasse uma divisão entre os carros e os nossos filhos”. O que os pais pedem à CML são medidas que melhorem a visibilidade da passadeira e um espaço para usufruto da comunidade escolar.

Vera Silva e Susana Oliveira, da Associação de Pais da EB1/JI Maria Marroso, são duas mães entre os muitos adultos, pais e mães, e crianças que se manifestaram contra a insegurança rodoviária junto àquela escola.

A Associação recebeu, pela primeira vez, em julho deste ano, uma resposta da área da Mobilidade, para agendar uma reunião. No dia 13 de julho, a direção da mesma apresentou um projeto de intervenção “que parece ter tido acolhimento favorável, mas sem compromisso de calendarização”. O plano propunha a eliminação de alguns espaços de estacionamento anteriores à passadeira e alargamento dos passeios no cruzamento junto à escola.

Passados dois meses e com a aproximação do início do letivo, ainda sem medidas de reforço de segurança, mesmo que provisórias, a associação voltou a contactar a CML. E, mais uma vez, não obteve resposta.

“Queremos mostrar aos nossos filhos que os pais vão agir”

Decidiram, então, no Dia Europeu Sem Carros, realizar uma ação de sensibilização pela segurança rodoviária, alertando para o problema, e para o protesto, a partir de uma publicação no Facebook e através de um comunicado dirigido à CML. Aos pais dos vários alunos era pedido que se juntassem para “mostrar à comunidade que a segurança rodoviária é uma preocupação de todos” diz Inês Pinto, Presidente da Associação.

O tão pedido sinal de passadeira e aproximação de escola foi colocado na véspera da manifestação, quatro anos depois da inauguração do estabelecimento de ensino.

As palestras de sensibilização “não chegam”.

“Ensinar regras de cidadania, enquanto as crianças reparam que a polícia não age, não é um bom exemplo”, diz Inês, lembrando um episódio em que um agente da PSP não interveio após um carro ter desrespeitado a passadeira porque “estava lá por causa das obras, não para controlar o tráfego. Queremos mostrar aos nossos filhos que os pais vão agir para alguma coisa mudar”. Na véspera desta manifestação, a Associação de Pais recebeu uma proposta de reunião para apresentação do projeto final para a zona.

E apareceu o sinal, na passadeira, em frente ao portão – um sinal pelo qual esperaram quatro anos. No dia do protesto, dois agentes da PSP do programa Escola Segura controlavam o tráfego. “Mas só devido à manifestação”, comenta Marta.

Falta saber o resto do resultado do projeto desenvolvido pela CML. Mas aqui, nesta escola, anseia-se para que se cumpra a promessa da ZER. Como diz Marta Paz, “numa zona com tantos peões, quando será a Baixa uma área pedonal?”


Nascida em Braga, Júlia Mariana Tavares fez de Lisboa casa, com vontade de contar histórias desta cidade cosmopolita e multicultural. Finalista de Ciências da Comunicação da Faculade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Católica Portuguesa, está a estagiar na Mensagem de Lisboa. Texto editado por Catarina Pires.

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3 Comentários

  1. O parque de estacionamento já existia antes da escola ser inaugurada, se o plano ZER for implementado, não sei se vai continuar a ter o acesso atual. Em relação à obstrução dos passeios pelas trotinetes podem agradecer à postura do vereador da mobilidade Miguel Gaspar, que é de total complacência, mal grado a tolerância zero adotada pela junta de freguesia de Santa Maria Maior.

  2. Todas as escolas deviam ter uma zona de segurança que impedisse o estacionamento num raio de 200 metros e desincentivasse o tráfego de atravessamento. A velocidade máxima permitida devia ser a dum parque de estacionamento: 10 km/h.
    Infelizmente é comum ver os próprios pais que vão de carro até à pirta da escola a darem diariamente o mau exemplo aos filhos. Não admira que depois apliquem esses maus exemplos a conduzir uma trotineta, uma bicicleta, uma mota ou um carro (nestes 2 casos com consequências muito mais graves).
    Era tão simples se os pais que têm mesmo que ir de carro o deixassem a 200 metros da escola. Seria como se morassem a 200 metros da escola e fossem o resto do caminho a pé.

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