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Está um dia de sol e Paulina Gallardo está à porta da sua mercearia, perto da Praça das Flores, em Lisboa. Está de bom humor, usa óculos de sol retro, mastiga um rebuçado, que tira da boca, exibe e explica. “É um rebuçado mexicano chamado Pulparindo. Para ti, pode ser picante, mas, para mim, é doce”, diz ela. Perguntamos se tem algum benefício para a saúde: “Não, claro que não. Todos os doces mexicanos fazem mal à saúde. Mas eu estou viciada. ‘Tomo-o’ ao pequeno-almoço”.
A loja de Paulina – Casa Mexicana [Rua Quintinha, 72B] – é brilhante e colorida. A mercearia em si é um doce para os olhos. “Sou de Tijuana, na fronteira entre o México e os EUA, mas cresci em San Diego, California”, diz Paulina. É justo dizer que se percebe uma mistura de sotaques enquanto Paulina fala.


Perguntamos-lhe o que queria ser quando era criança. “Penso que sempre quis ser artista. Adorava atuar para os amigos e cantar. E estive na televisão durante algum tempo”, diz ela. Nós sabíamos! Paulina tem um à-vontade natural com a câmara e não parece nem um bocadinho tímida. “Primeiro, fui a menina da meteorologia. Trabalhava para a Univision [canal de televisão mexicano]. Depois fiz um programa da manhã, as notícias e um programa de viagens”. “Então, és famosa?”, perguntamos. “Não, de todo”, responde ela com embaraço.
Paulina veio para Lisboa pouco antes da pandemia, com o marido, depois de a sogra se ter mudado para cá. “Penso que há cerca de 2000 mexicanos em Portugal”, diz Paulina [na verdade, eram 640, em 2021, de acordo com dados do GEE/SEF]. “Há muitos estudantes que vêm para um semestre e a Cisco Systems parece estar a contratar muitas pessoas do México”.
Perguntamos a Paulina porque decidiu ela abrir a Casa Mexicana. “Basicamente, eu só queria cozinhar e não conseguia encontrar os ingredientes. Comecei por pensar em encomendar produtos. Depois pensei que podia abrir uma pequena loja online. E uma coisa levou a outra”, diz ela.

“Alguma vez pensaste que irias gerir uma loja de comida mexicana?” “Não, nunca. E para ser honesta, não há muitas lojas como esta noutras cidades. Eu só tenho aqui os produtos de que gosto e as marcas em que confio. Os ingredientes que usaria para cozinhar estão todos aqui”, diz ela.
Paulina continua a mostrar-nos a sua seleção chique de chili. “Temos tantos tipos diferentes de chili. Cada chili traz a sua própria identidade a um prato. Mas as pessoas têm de saber que nem toda a comida mexicana é picante”, esclarece.
Por brincadeira, perguntamos a Paulina: se fosses um chili, qual serias? Ela nem sequer tem de pensar. “Seria uma pasilla. Adoro o perfil do sabor. É sexy. Não me considero sexy. Mas sou um bom sabor, e estou bem rodeada”, diz ela.
Dito isto, Paulina decide que quer levar-nos a conhecer a sua nova aposta: um restaurante mexicano no Bairro Alto chamado Mezcaleria “La Cenaduría Nice” [R. Luz Soriano 44]. “Vamos”, diz ela, arrancando porta fora.

No caminho, recebe uma chamada. Está agora em pleno modo mulher de negócios. “Penso que os preços estão realmente a estabilizar se se quiser investir em Lisboa. Estou sempre a seguir a Idealista, e constato muitas descidas de preços. Durante muito tempo, só víamos tudo a subir, subir, subir”.
O que Paulina considerou mais difícil na abertura do negócio dela em Lisboa? “A contabilidade, meu Deus”. E a burocracia portuguesa. Passei por quatro contabilistas antes de perceber como tudo funcionava. Não é possível fazer a coisa sem ajuda, especialmente se fores estrangeiro. Precisas de alguém que esteja lá para ti e que te apoie”.
Ao subirmos uma colina íngreme, Paulina diz que adora as colinas de Lisboa. Já sem fôlego, tentamos acompanhar. “Eu não estou inscrita no ginásio, por isso adoro. Este é o meu treino diário. A correr constantemente de um lado para o outro entre o restaurante e a loja”.


Quando chegamos ao restaurante da Paulina, o cozinheiro já está a preparar alguns pratos para experimentarmos. Paulina dá-nos a experimentar uma variedade de bebidas mexicanas. São doces, é o melhor que podemos dizer no momento em que escrevemos. Há um alinhamento fantástico de molhos de chili, num cenário vermelho. “Penso que o que fazemos aqui é comida a sério. Sem complicações, sem tretas”.
Apesar de toda a correria e da aparente autoconfiança, Paulina fala-nos da verdadeira Paulina. “O meu verdadeiro eu é, na verdade, super-tranquilo. Gosto de estar em silêncio. Provavelmente, porque tenho de falar muito no meu trabalho. Mas preciso de tempo para mim própria apenas para me centrar, para relaxar, e depois volto ao mundo e ponho o espetáculo em marcha”, diz ela enquanto abre os braços ao estilo da Broadway.
Apesar de vender comida mexicana em Lisboa, Paulina admite não gostar muito de alguns clichés relativamente aos mexicanos. “Como povo, temos muito sentido de humor. Portanto, não nos importamos de ser um bocadinho gozados. Mas sabem, por vezes, quando vou a um programa de televisão e me pedem para usar um sombrero… digo que não. Não posso estragar o meu cabelo”, diz ela com uma gargalhada. “A música cliché a mesma coisa… não”.
Provámos alguma da comida cozinhada pelo chef de Paulina, que era deliciosa. Veio com um crocante e tinha potencial para ser muito confuso, mas vencemos os obstáculos com dignidade.

Para terminar, pedimos a Paulina algumas palavras sábias. “As pessoas têm de começar a fazer o que querem fazer. Parem de pensar demais. Se comerem bem, bebam bem… Não vou dizer a última coisa”. Ela ri-se em voz alta.
Somos lentos. “Espera, o que ias dizer?”
É demasiado tarde. O momento já passou. E, assim, dizemos “Adios” à nossa amiga Paulina.
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