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Poder-se-ia dizer que o CoCasa é mais que um escritório, é mais que um co-work? O seu criador, o australiano Jackson Irwin, aterrado em Lisboa há apenas um ano diria mais. “Há portugueses e estrangeiros que fazem tudo aqui, menos dormir!” 

Por enquanto, são sete clientes permanentes que podem agilizar processos ou embarcar em novas parcerias. Pagam 200€ por mês por estar a trabalhar neste espaço, ou 250€, se também quiserem almoçar. Depois, há os outros clientes, daqueles que só vêm às vezes e que, por 10€, passam o dia e comem uma refeição simples. As bebidas nunca estão incluídas. 

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Mesmo às portas do Miradouro de Santa Catarina, o ex-hostel Oásis Backpackers, criado há mais de 15 anos durante a leva dos hostels pioneiros de Lisboa, foi obrigado a reinventar-se. “A pandemia não é uma situação fácil para quem vive do turismo”, explica Jackson que, em tempos foi hóspede do antigo alojamento. “Estive cá como turista. Passei três meses hospedado.” Quando regressou a Melbourne, levava consigo a nova namorada, Maria, da Oyster Point, agora responsável pelos pop ups de ostras frescas a 18€ a dúzia que animam a maioria dos sábados da CoCasa. Nunca mais se largaram. 

Aliás, pode dizer-se que o CoCasa “kind of” germinou-se através da longa história de amor entre a portuguesa e o australiano. ”Fomos juntos para a Austrália, onde estivemos a trabalhar em vendas. A certa altura, decidimos viajar pelo mundo. Estávamos no Brasil quando a pandemia começou. Ainda resistimos uns tempos, até que pensámos que o melhor seria regressar a Portugal”, conta. “Nunca esqueci este lugar e voltei cá quando aterrei novamente na cidade.”

Com o hostel em dificuldades, algumas semanas de insistência foram suficientes para convencer o proprietário do edifício a converter o modelo de negócio. “Isto estava morto, cheio de problemas estruturais, sem perspetivas de se reerguer. A minha proposta, nestas circunstâncias, parecia meio louca mas, às tantas, já era a única saída possível.”

E sublinha que o problema não era apenas a pandemia. “Os hostels já estavam em declínio antes. Começaram assim que apareceu os smartphones, o wifi e o uso massivo das redes sociais. As pessoas deixaram de os procurar para conhecerem outras pessoas ou conviver. Está tudo online. O espírito que antes existia nos hostels perdeu-se, deixou de ser necessário”, explica.

A ideia de espaço que juntasse pessoas deixou de ser o hostel e passou a ser o tipo de cowork que também possibilitasse períodos de desconexão da tecnologia. Porque é nesses períodos que os “humanos digitais” arranjam disponibilidade para se ligarem fisicamente a outras pessoas.  

O australiano Jackson Irwin, 31 anos, gestor da CoCasa, tem um estilo de liderança horizontal. “Aqui somos todos iguais”, diz. Foto: Rita Ansone

Com a ideia bem definida, repescou Mubashir Hussain, o paquistanês aka Bash, que trabalhava no hostel há sete anos, e começou a lavar a cara ao espaço que, entretanto, se degradara. “Assim está bem melhor. E a grande vantagem é que, se antes, as pessoas vinham só para passar uns dias, agora, é possível criar relações duradouras. Os nossos clientes passaram a estar aqui todos os dias, durante longos períodos. Suspeito que alguns vieram para ficar para sempre”, diz Bash que, aproveitando a onda criativa do lugar, acabou por inventar o próprio negócio. Agora, além de continuar a ajudar no dia-a-dia do cowork, organiza pop ups de gastronomia vegan e vegetariana do Paquistão.

“Não sou líder, sou mais um elemento na estrutura. Aqui, somos todos iguais”

Com o pequeno palacete assegurado, Jackson tratou de juntar uma equipa. “Não queria uma estrutura tradicional, com um chefe e subordinados”, explica. O processo de escolha do nome do novo espaço exemplifica bem a forma pouco comum com que o australiano gere a equipa – foram a votos. “Tinha conseguido juntar 6 pessoas para arrancar com o projecto e pedi-lhes para pedirem a opinião a amigos.”

Havia quatro nomes possíveis: Village Palm, uma referência à imponente palmeira do pátio da entrada; Casa Coso, a significar Collaborative Social House; Casa Soco, sabe-se lá porquê, mas na mesma ordem de ideias da anterior; e CoCasa, que ganhou com 15 dos votos dos 25 participantes. Este pontapé de saída do líder da organização definiria o tom de todo o trabalho que se seguiria: “Não sou líder, sou mais um elemento na estrutura. Aqui, somos todos iguais.”

E, de lá para cá, juntaram-se ainda mais pessoas com projetos pessoais e sete negócios de frequentadores que também acabaram por se juntar à imensa equipa de 23 elementos. Todos mais amigos do que colegas. 

A ideia é apoiarem-se sem restrições. “A Covid veio mostrar-nos que o contacto social é essencial. No trabalho, no lazer, a levantar projetos”, afirma Jackson. “Somos um conjunto de pessoas, cada um com o seu negócio, que se uniu para apresentar os próprios projetos dentro de outro grande projeto”, explica.

No fundo, o lema é estarem todos por uma CoCasa e uma CoCasa que estará também por todos. “Colaborar faz parte do nosso nome e do nosso objetivo como equipa”, garante com a mesma fé que o fez avançar com esta “forma louca de organizar uma equipa.” E deixa um aviso de visionário: “A colaboração é a forma de organizar as equipas do futuro. Nós adiantámo-nos e começámos já.”

“Há serviços, eventos e pop ups para todos os gostos”

A verdade é que tem resultado e a comunidade colaborativa é fértil em criatividade e rápida a concretizar ideias. Em pouco mais de três meses de existência, já sugiram tantas coisas que fica difícil contá-las. “Há serviços, eventos e pop ups para todos os gostos,” diz Jackson.

Entra-se e dá-se logo com uma pequena esplanada com várias mesas e uma palmeira imponente rodeada de catos. Subindo a escadaria, há uma sala de estar à direita e, à esquerda, o bar, explorado pelo café “Buna” todos os dias, das nove às três da tarde.

No segundo andar, os três antigos quartos de hostel foram transformados em escritórios com quatro secretárias cada, onde é possível trabalhar com mais concentração e sem as distrações da vida que se leva no rés-do-chão.

Subindo mais escadas, chega-se ao sótão. Aqui, há dois estúdios. O grande é usado para eventos como, por exemplo, sessões de documentários, tertúlias de poesia ou venda e troca de roupa usada. Também é aí que, às segundas e quartas, pelas cinco e meia da tarde, decorrem as aulas de yoga da Tara, pensadas especialmente para relaxar trabalhadores digitais que passam o tempo sentados a dedilhar num teclado. Custam 10€ quando compradas avulso porque basta aparecer e dizer que se vai à atividade, sem a obrigatoriedade de se fidelizar mensalmente. O estúdio mais pequeno, está a ser transformado para permitir que se gravem podcasts, rádios online ou vídeos para o YouTube. 

A garagem da casa também foi convertida – passou a ser um armazém de negócios online. Por agora, é uma selva de plantas de teto, pequenas palmeiras, catos, plantas-queijo-suíço, flores-de-cera e estrelícias da Janvier, que as vende através do seu site e faz as entregas ao domicílio. 

Brevemente, haverá vários workshops, entre os quais, um de aprender a fazer bebidas fermentadas, como as kombuchas coloridas e deliciosas que se vendem no bar. O Gonçalo aparece cinco vezes por semana para dar umas massagens que todos ali garantem que já são indispensáveis. Especialmente depois dos dias árduos de reuniões online e das pressões frequentes dos deadlines para cumprir.  

E também há os já famosos pop ups, que acontecem praticamente todos os dias por ali, mas que se tornaram populares em quase todos os cantos de Lisboa. Na verdade, à falta de perspetivas que assegurem que o investimento num restaurante trará retorno, esta foi uma forma encontrada por muitos empreendedores para contornar as típicas dificuldades da burocracia à portuguesa assim como alguns dos encargos que, especialmente em períodos de incerteza como é o da pandemia, acabam por derrubar um negócio mesmo antes deste nascer. E tem resultado: os clientes parecem estar a adorar este conceito inovador em que os menus deixaram de ser estáticos e vários restaurantes da cidade passaram a oferecer as refeições surpresa. Almoçar ou jantar pop ups tornou-se trendy.

Uma parte dos colaboradores da CoCasa também identificaram a tendência e criaram negócios que rodam por vários espaços da cidade com os seus menus pensados para a ocasião e o lugar onde serão servidos. Uma espécie de catering no restaurante. Na CoCasa a ideia é ir fazendo apresentações destes menus, a maioria inspirados na street food. O espaço tornou-se numa espécie de montra dos pop ups que circulam na cidade. 

O pátio da CoCasa é onde se realizam os eventos gastronómicos promovidos pelos clientes do espaço de cowork. Foto: Rita Ansone

O pequeno pátio da entrada é o palco dos eventos que, geralmente, arrancam às seis da tarde e custam entre 7 e 10€ por pessoa. Nesta feira de comidas do mundo poderá encontrar-se refeições tão diversas como ostras, burritos e nachos, pizzas, hambúrgueres de vários andares, pratos paquistaneses ou gastronomia vietnamita desenvolvida por chefs de cozinha franceses. A maioria dos pratos é vegan ou vegetariana, mas é possível encontrar de tudo, dependendo de quem está responsável pelo pop up desse dia. Quando é a Kendrick Sandwichs a aparecer, por exemplo, os kebabs atulhados de sabor e de cor fazem as delícias da noite. 

Por fim, há fins-de-semana em que, de repente, surge um brunch turco, animado por DJs que passam os sons da região. Aliás, os planos mais imediatos de Jackson passam por agitar a época de Verão com cada vez mais brunchs, de vários estilos e pontos do mundo. Só ainda não se sabe muito bem quais serão.

É que a regra é nunca saber bem o que se irá encontrar por ali, que novo colaborador irá aparecer com mais uma ideia para mostrar. A não ser que passe a seguir toda esta malta através do Instagram. Deixamos a pista: @cocasa.lisboa.

* O projeto People of Lisbon pode ser seguido aqui.


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