Desde 1990 que se fala numa linha TGV para ligar Lisboa a Madrid em apenas três horas, mas o investimento teima em não sair do papel. Nas últimas três décadas, o projeto tem sido travado pela falta de vontade política em Portugal. O histórico nacional de indecisões é causa de desconfiança do lado espanhol, embora Espanha também não tenha priorizado a ligação. Portugal não tem hoje um único quilómetro de rede de alta velocidade, Espanha opera a segunda maior rede de alta velocidade do mundo, só atrás da China – mas nenhuma ligação a Portugal.

O troço Lisboa – Madrid integra o Corredor Atlântico da Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T), um de sete corredores considerados prioritários pela União Europeia, que pretende aumentar as ligações internacionais e duplicar o tráfego ferroviário de alta velocidade entre os Estados-Membros até 2030, em relação a valores de 2015, e assim evitar o tráfego aéreo poluente entre cidades com ligação ferroviária.

A Comissão Europeia acaba de publicar a decisão da implementação da linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid até 2030. Nesse ano, o tempo de viagem entre as duas cidades será de cinco horas, uma redução de quatro horas no tempo de viagem atualmente possível.

Quatro anos depois, em 2034, os trabalhos deverão ficar totalmente concluídos, com as duas cidades a ficarem a uma distância de três horas. Mas o serviço pode melhorar significativamente já em 2026. A inauguração do primeiro troço de alta velocidade português, entre Évora e Elvas, torna possível a criação de um serviço ferroviário com duração de seis horas. Em comunicado lançado esta manhã, o Ministério das Infraestruturas e Habitação confirma o acordo para a ligação ferroviária, bem como as referidas metas.

Por agora, Lisboa é uma de apenas quatro capitais europeias sem ligação de comboio direta a um país vizinho, a par de Helsínquia, Tallinn e Atenas.

Nos últimos dois anos formou-se um aparente consenso político nacional para avançar, embora questionando-se agora a capacidade de execução, até 2034, de várias obras públicas essenciais à concretização da linha que falta, como é o caso da Terceira Travessia do Tejo.

Num dos mais quentes dias de agosto, a Mensagem fez a viagem de comboio possível. Quem sai de Lisboa de manhã e procura chegar a Madrid a tempo de jantar precisa de apanhar quatro comboios e fazer três transbordos, numa viagem que demora mais de 11 horas. É possível fazer esta viagem em cerca de nove horas, apanhando dois comboios do lado português e um único do lado espanhol, mas chegando a Madrid já depois das dez da noite.

Neste artigo, exploramos o passado, presente e futuro da ligação ferroviária entre Lisboa e Madrid e colocamos o foco nas razões que têm travado a linha de alta velocidade entre duas capitais europeias que distam apenas 500 quilómetros.


Lisboa – Madrid: uma rota inaugurada em 1866

Viajar entre Lisboa e Madrid de comboio é hoje “uma aventura” – a expressão usada por Frederico Francisco, secretário de Estado das Infraestruturas entre janeiro de 2023 e abril de 2024.

Talvez seja até uma aventura maior do que em 1866, quando foi estabelecida a primeira ligação ferroviária direta entre as duas cidades. Do final do século XIX até 2020, com a chegada da pandemia, era possível viajar do centro de Lisboa ao centro de Madrid apanhando um único comboio. Desde então que deixou de existir ligação direta.

Antes de existir autoestrada entre Lisboa e Madrid e antes do avião figurar como opção acessível a boa parte das carteiras, a ferrovia foi, durante décadas, a única hipótese.

Ao longo dos últimos 159 anos, desde a primeira viagem entre as duas cidades, estabeleceram-se vários serviços de comboios diretos, diurnos e noturnos.

A 7 de outubro de 1866, é inaugurada a rota Lisboa – Madrid. O comboio partia, pela primeira vez, de Santa Apolónia a caminho da capital espanhola. Naquela época, a CP – Comboios de Portugal – era a Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses.

Em novembro de 1887, começa a circular o Sud Express, ligando Lisboa, Madrid, Paris e Calais. Chegou a ser possível comprar bilhete de Lisboa até Londres, com a travessia do Canal da Mancha, a partir de Calais, a fazer-se de barco. Mais recentemente, este serviço ligava Lisboa a Hendaia, nos Pirinéus. Nele vieram muitos dos refugiados políticos entre 25 de Abril de 1974 e os tempos a seguir.

Cartaz do Sud Expresso, 1890. Fonte: Biblioteca Nacional de França

Em 1927, o comboio “rápido” até Madrid passava a realizar-se diariamente. A viagem demorava cerca de 16 horas.

Em 1943, inaugura-se o Lusitânia Expresso, um comboio noturno com compartimentos cama e carruagens de segunda classe com bancos em serviço até 1995

Em 1967, surge o Rapido TER ou Expresso TER. O comboio diurno ligava Lisboa a Madrid em nove horas e 15 minutos. Funcionou até 1989. A 31 de março de 1969, trouxe Simone de Oliveira a Lisboa, após o Festival Eurovisão da Canção de Madrid. Em Santa Apolónia, esperavam-na milhares de pessoas, como recorda o podcast Sobre Carris, do Público.

Carlos Cipriano, jornalista no Público especializado em ferrovia, utilizou várias vezes o TER – Tren Español Rapido, ou comboio rápido espanhol, em português.

“Era, para a época, um comboio de luxo. Tinha ar condicionado, serviço de refeição ao lugar, era muito confortável”.

Recorda, contudo, “uma viagem monótona, com paisagem monótona” e, por ser na altura “um miúdo de 20 anos que viajava com a mochila às costas”, preferia a experiência de viajar de noite, no Lusitânia Expresso. “Tinha carruagem restaurante, podia ir nos copos com o pessoal até à noite, tinha carruagens compartimento e toda uma dinâmica e uma forma de viajar completamente diferente da do TER, que era mais parecido com uma viagem de autocarro ou de avião”.

Em 1989 e 1995, funcionou o último comboio diurno entre as duas cidades – o Talgo Luís de Camões. Este serviço foi o mais rápido até hoje, com a viagem a levar sete horas e 50 minutos entre Madrid e Lisboa.

Talgo Luís de Camões, na estação de Abrantes, 1993. Foto: Phil Richards

A última ligação ferroviária entre as capitais da Península Ibérica funcionou durante 25 anos – entre 1995 e 2020. O Lusitânia Comboio Hotel substituiu o Lusitânia Expresso e era operado em parceria entre a CP e a congénere espanhola Renfe. Ligava as duas cidades em 10 horas e 15 minutos, com 17 paragens pelo caminho. Tinha compartimentos cama, alguns com casa de banho e duche privados. Saía diariamente da estação de Santa Apolónia, às 21 horas e 25 minutos, chegando à estação Atocha, no centro de Madrid, às oito horas e 15 minutos da manhã.

Em 2019, Greta Thunberg chegou a Lisboa de barco, vinda de Nova Iorque, e utilizou o Lusitânia Comboio Hotel para participar na COP 25, a cimeira do clima da ONU, realizada em Madrid. Na altura, a ativista pelos direitos humanos queria evitar, simbolicamente, utilizar o avião.

A 17 de março de 2020, a pandemia levou à suspensão temporária das ligações a Madrid e ao sul de França.

Mas o temporário rapidamente passou a definitivo.

Portugal perdia, assim, as suas duas principais ligações ferroviárias para fora do país. Recorde-se que o Lusitânia Comboio Hotel circulava desde 2012 pela Linha da Beira Alta em composição dupla com o Sud Express, comboio que ligava Portugal a Hendaia, do lado francês da fronteira com Espanha. Os dois serviços separavam-se em Medina del Campo, altura em que o Lusitânia seguia para Madrid e o Sud para os Pirinéus, a partir de onde era possível seguir para outros destinos europeus, como Paris.

Desde então, Portugal procurou junto do governo espanhol a retoma da ligação noturna a Madrid, sem sucesso.

A suspensão dos dois principais serviços ferroviários internacionais resultou numa perda significativa do número de passageiros a cruzar a fronteira de comboio.

“Não por falta de vontade portuguesa – falta de empenho, talvez”, garante Carlos Cipriano, que explica que “foi Espanha que unilateralmente deixou a CP pendurada”, lembrando que as duas empresas partilhavam custos e receitas neste serviço.

A falta de interesse do lado espanhol poderá explicar-se “por dois motivos” – por um lado, Espanha “aposta na alta velocidade, secundarizando o caminho de ferro convencional”, como é o caso da atual rede ferroviária portuguesa. Por outro, porque, do lado espanhol, a aposta está “na relação com França e não na relação com Portugal”.

Os 500 quilómetros que separam Lisboa de Madrid são os mesmos 500 quilómetros que separam Madrid de Barcelona, mas, no segundo caso, existe linha de alta velocidade e a viagem leva hoje apenas duas horas e 37 minutos.


Em 1992, por ocasião da Exposição Universal de Sevilha, Espanha inaugurou a sua primeira linha de TGV, ligando Madrid a Sevilha. Hoje, a rede de alta velocidade espanhola é a quarta mais extensa do mundo, com cerca de quatro mil quilómetros, só ultrapassada pela China.

Enquanto que em Espanha existe, desde então, um forte consenso político em torno da importância estratégica do investimento na rede de alta velocidade, em Portugal a prioridade foi outra.

Portugal apostava tudo na expansão da sua infraestrutura rodoviária. E 1990 tinha apenas 300 quilómetros de autoestrada. Em três décadas, segundo o jornal Eco, houve uma brutal evolução: Portugal passou a ser “o segundo país europeu com a maior rede de autoestradas por habitante”, com mais de três mil quilómetros.

Em simultâneo, Portugal desinvestiu na ferrovia. Entre 1995 e 2018, a rede rodoviária cresceu 364% e a rede ferroviária nacional perdeu 18% da sua extensão, segundo a associação ambiental Greenpeace.

“Da parte do poder político em Portugal, tem havido um desinteresse no investimento no transporte ferroviário”, denuncia Manuel Tão, doutorado em economia de transportes e especialista em ferrovia da Universidade do Algarve. E Portugal entrou na Comunidade Económica Europeia precisamente no mesmo dia de Espanha – a 1 de janeiro de 1986.

“Se formos a ver, chegámos à Comunidades Europeia com uma rede ferroviária de 3600 quilómetros e neste momento temos 2500 [em exploração]. Tínhamos cinco fronteiras ferroviárias e hoje temos três.”

Das três ligações ferroviárias internacionais que Portugal mantém, apenas duas têm hoje serviço de passageiros – Valença, na ligação a Vigo, e Elvas, na ligação a Badajoz. Esta última integra hoje a viagem possível para Espanha e, aqui, o cruzamento da fronteira, até Badajoz, faz-se na Linha do Leste, a bordo de automotoras Allan, pequenos comboios a diesel com velocidade máxima de 100 quilómetros por hora e capacidade para setenta passageiros – uma espécie de autocarro sobre carris. Entraram ao serviço na década de 1950 e foram, desde então, modernizados.

“Construímos mais de três mil quilómetros de autoestrada. Faltou dinheiro a Portugal? Não. Faltou vontade política e interesse no transporte ferroviário.”

Foi sendo estabelecida “toda uma economia em torno da estrada e da autoestrada e houve uma ausência completa de uma estratégia de desenvolvimento do território” Para Manuel Tão tudo isto advém da falta de conhecimento, tanto da classe política, que só conhece “o avião para Bruxelas”, quanto dos eleitores: “Como se pode pedir que votem noutra visão se eles próprios desconhecem o cenário alternativo?”

Frederico Francisco, Secretário de Estado das Infraestruturas no último governo de António Costa, também acredita que “esse é um dos grandes entraves” à priorização do investimento português na ferrovia.

“Falta perceção pública sobre quão bom o serviço ferroviário pode ser. E sobre quão melhor pode ser, quer face ao avião, quer face à rodovia. Em Portugal, infelizmente não temos uma cultura de transportes públicos.”

E a a crónica falta de aproveitamento dos fundos europeus destinados à ferrovia constitui “um desperdício”: “Dispersamos os fundos europeus em micro-projetos locais, porque cada município tem que ter o seu pequeno projeto, e perdemos capacidade de financiar projetos de escala nacional”,

O agora deputado considera que há uma “excessiva dependência dos fundos europeus”. “Se estivermos dependentes dos fundos europeus para fazer todo este investimento ou dependentes de taxas de comparticipação de 80%, que é aquilo que se fala, então nem vale a pena”.

Frederico Francisco, Secretário de Estado das Infraestruturas entre janeiro de 2023 e abril de 2024. Foto: Frederico Raposo

Entre 2000 e 2017, Espanha aproveitou quase metade do total dos fundos europeus destinados à alta velocidade, mais de 11 mil milhões de euros de um total de 21,8 mil milhões – o que significou um cofinanciamento europeu de cerca de 26% do total investido. Ao todo, entre 1992 e 2022, Espanha investiu 57,2 mil milhões de euros na sua rede de alta velocidade ferroviária.

Já em 1990, quando se começou a planear a linha de TGV Lisboa – Madrid, a sua concretização ficou dependente de uma comparticipação europeia maioritária.

Apesar de fraco investimento e dependência e fundos exteriores, o investimento na ferrovia tem sofrido uma evolução positiva. Frederico Francisco explica que entre 2015 e 2024 “passou de um investimento anual na rede ferroviária inferior a 100 milhões de euros por ano, para entre 500 a 600 milhões de euros”. Mas há necessidade de se “atingir um nível total de mil milhões de euros por ano”.

Analisando os valores de investimento executados e as taxas de execução dos investimentos, a partir de um relatório de monitorização da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT), verifica-se um aumento do substancial dos investimentos na ferrovia nacional entre 2016, que regista apenas 39,3 milhões de euros executados, e 2023, com 550,4 milhões de euros aplicados. A taxa de execução também cresceu, de 45,5% em 2016, para 61,3% em 2023.

Muita conversa, planos rasgados e zero quilómetros de alta velocidade

“O elevadíssimo custo implica que a linha Lisboa – Madrid não pode ser considerada prioritária em Portugal neste momento.”

Joaquim Ferreira do Amaral, à data Ministro das Obras Públicas e Transportes
Dezembro de 1990

Em dezembro de 1990, era aprovado em conselho de ministros da CEE o traçado da rede de alta velocidade para Portugal, prevendo a ligação de Lisboa a Madrid até 2000. Já aqui, a posição do governo PSD, de Aníbal Cavaco Silva, era a de que a obra só poderia avançar se fosse garantida uma comparticipação europeia de 70% do custo total da obra.

O comboio não era prioridade: a década de 1990, seria dada ordem de encerramento a mais de 700 quilómetros da rede ferroviária nacional.

Ao longo das três décadas que se seguiram, os anúncios políticos que previam a construção da linha multiplicaram-se, mas esta nunca se materializou. O discurso político seguiu um rumo idêntico – de diz e contradiz, numa narrativa de incertezas, comum a governos PSD e PS.

Em dezembro de 2001, no governo PS de António Guterres, apontou-se o início da construção para 2006 e conclusão para 2010.

Em 2003, o maior anúncio político da obra, juntou os primeiros ministros de governos de direita – o português, Durão Barroso, e o espanhol, José María Aznar na Cimeira Ibérica da Figueira da Foz.

Aqui se estabeleceu o traçado final para a ligação, “a sair de Lisboa pela península de Setúbal, a passar por Évora, depois ir a Caia”, junto a Elvas, onde a fronteira seria cruzada. Depois, Badajoz, Mérida, Cáceres, Toledo e, finalmente, Madrid.

Perspetivava-se uma ligação em duas horas e 45 minutos em 2010, com a linha a assegurar velocidades de 350 quilómetros por hora.

Em dezembro de 2005, já com José Sócrates como Primeiro Ministro, é finalmente apresentado o projeto que era “prioritário”. Sócrates afirmava: “Desistir do TGV seria rendermo-nos ao atraso”.

O projeto da linha Lisboa – Madrid, com um custo de 2.400 milhões de euros até à fronteira espanhola, teria comparticipação europeia de 60% e a obra arrancaria em 2008. Apesar de se viver um período de instabilidade financeira, o governo PS reafirmava a importância da obra.

“O facto de conjunturalmente Portugal viver num período de dificuldades económicas não justifica que se interrompa o desenvolvimento destes projetos. Tal interrupção só agravaria o atraso de Portugal em matéria de modernidade e competitividade no espaço ibérico e comunitário.”

Mário Lino, à data Ministro das Obras Públicas e Transportes
Dezembro de 2005

A direita, contudo, rejeitava o projeto. Em resposta à apresentação pública, o PSD, pela voz do secretário geral do partido, Miguel Macedo, falava em “enorme precipitação” e acusava o governo de querer “enganar os portugueses” passando a “ilusão de estarmos num país rico, quando a verdade é que atravessa graves dificuldades”.

Do lado do governo de José Sócrates, a aposta no TGV era defendida, com a previsão de que esta teria “efeitos positivos na economia”, prevendo-se um crescimento do PIB português de 1,6% no ano pico da obra, em 2012, assim se lia na edição de 27 de dezembro do jornal do Partido Socialista (PS).

“Se formar governo, risco o TGV. (…) Gostaria imenso de viver num palácio, acontece que não posso porque não tenho dinheiro para isso.”

Manuela Ferreira Leite, à data presidente do PSD
Janeiro de 2009

Em 2012, o projeto cai por terra, depois do Tribunal de Contas chumbar a concessão do troço entre Poceirão, na margem sul do Tejo, e Caia, na fronteira com Espanha.

Nesta altura, o Estado já havia desembolsado 152,9 milhões de euros no projeto, que incluía também a linha Lisboa – Porto, segundo relatório da auditoria realizada pelo Tribunal de Contas ao projeto da rede de alta velocidade.

Na altura, o Estado foi ainda condenado ao pagamento de 150 milhões de euros ao consórcio vencedor do concurso, mas recorreu da decisão. O pagamento da indemnização, estimada em 2024 em 230 milhões de euros devido aos juros de mora, ainda espera decisão da Justiça.

E Portugal continua, hoje, sem inaugurar um único quilómetro da sua rede de alta velocidade.

Apesar disso, a futura linha já tem troços concluídos do lado espanhol e, do lado português, um troço próximo da conclusão – a secção Évora – Elvas, com cerca de 90 quilómetros de extensão, deverá ser inaugurada no próximo ano e será parte integrante da futura linha de alta velocidade entre as duas capitais.

É o maior troço de ferrovia construído de raiz em Portugal no último século.

Para que seja concretizada por inteiro, faltam ainda investimentos do lado espanhol e do lado português, com o troço Lisboa – Évora ainda sem projeto e com a necessidade de construir a Terceira Travessia do Tejo (TTT).

De contrato rasgado nasce tabu nacional

Após o rasgar do projeto de alta velocidade de José Sócrates, o tema transformou-se em tabu nacional. “Tudo parecia estar encaminhado”, lembra Frederico Francisco. “O concurso chegou a ser adjudicado, chegou a ser assinado o contrato”. A clivagem política entre PS e PSD, bem como o chumbo do Tribunal de Contas, faziam assim nascer um tabu nacional.

O PSD, que apresentara o projeto em 2003, na cimeira ibérica da Figueira da Foz, agora opunha-se. E ajudou a criar a sensação que “a alta velocidade era uma obra faraónica”, diz o especialista. “Esse foi o maior dano que foi feito, não foi só abandonar-se o projeto nesta altura.”

Durante uma década, não se falou em alta velocidade ou em TGV. Em 2018, o Primeiro Ministro António Costa destaca o tema proibido no debate público em Portugal, em entrevista ao jornal espanhol ABC.

“A alta velocidade com Espanha é um tema tabu em Portugal e assim será por muito tempo.”

António Costa, à data Primeiro Ministro
Fevereiro de 2018

Costa afirmava ser necessário passar por um “tempo de tranquilidade”, sem falar sobre o assunto, e considerava que “não existe nenhum [outro] lugar no mundo em que a direita e a esquerda se diferenciem por ser pró alta velocidade ou contra”.

Acácio Pires, especialista em transportes e membro do conselho geral e Policy Officer da associação ambiental ZERO, aponta agora para o custo temporal do tabu. “Vamos demorar cerca de 20 anos a recuperar desta decisão. Até porque, depois da Troika, os governos que se seguiram mantiveram este tabu durante demasiado tempo, sem discutir os seus pressupostos. Só a partir de 2019, com um movimento climático muito intenso e o reflexo que isso teve em termos de legislação europeia é que se começou a equacionar esta questão.”

“De Madrid para Lisboa, vamos de avião.” Quanto pesa o lóbi da aviação?

Em 2020, Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial, fazia uma declaração reveladora da falta de prioridade dada por Portugal à alta velocidade ferroviária entre Lisboa e Madrid: “O reino de Espanha colocou-nos numa situação que não é fácil, quando quase nos impôs Madrid – Lisboa”, disse, sublinhando que a prioridade nacional era o Eixo Atlântico – Lisboa, Porto e Vigo.

“A nossa prioridade não é Madrid – Lisboa. De Madrid para Lisboa, vamos de avião.”

Ana Abrunhosa, à data Ministra da Coesão Territorial
Outubro de 2020

Com Madrid a 1h20 de avião de Lisboa, a menos de seis horas de automóvel e sem uma aposta renovada nos caminhos de ferro, a ferrovia perdeu importância. Com a perda do comboio noturno, que permitia sair de Santa Apolónia após a hora de jantar, chegando ao centro de Madrid às oito da manhã, hoje esta é uma viagem praticamente reservada a entusiastas da ferrovia e a quem está a fazer um Interrail, facto que a Mensagem comprovou na viagem que fez recentemente.

Perante a inexistência de um serviço ferroviário direto e eficiente, a viagem de avião tornou-se a escolha óbvia – isto apesar de as duas cidades distarem, apenas, 500 quilómetros.

Multiplicam-se as viagens de operadores de autocarros – mais de 20 viagens por dia, em cada direção.

A ponte aérea Lisboa-Madrid é hoje a ligação mais importante do aeroporto de Lisboa, com cerca de 40 voos diários entre as duas cidades e com um total de 1,9 milhões de passageiros em 2024, tendo esta rota ficado inclusivamente no top 10 das mais movimentadas, por aeroporto, na região Europa, Médio Oriente e África (EMEA).

Avião levanta voo do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. Foto: Inês Leote

Em 2024, ano em que o aeroporto de Lisboa bateu o seu recorde de passageiros, com 35,1 milhões de viajantes, o tráfego com origem e destino em Madrid representou mais de 5% do total de passageiros.

Com a abertura da linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid prevista para 2034, será de esperar um impacto significativo no tráfego aéreo entre as duas cidades. Dados da vizinha Espanha apontam para isso mesmo.

Um relatório elaborado pela consultora PwC para a companhia aérea espanhola Iberia revela que, entre 2007 e 2019, nas cinco rotas domésticas em que existe alternativa de alta velocidade (Madrid – Barcelona, Madrid – Málaga, Madrid – Valência, Madrid – Alicante e Madrid – Sevilha) o número de passageiros de avião caiu de 8,97 milhões para 4,06 milhões – uma descida de cerca de 55%.

“Os viajantes substituíram o avião pelo comboio de alta velocidade nas viagens em que este oferece uma alternativa satisfatória, sobretudo de ponto a ponto”, lê-se em nota de imprensa da Iberia.

Com a entrada em funcionamento do aeroporto em Alcochete, e numa altura em que o valor máximo de movimentos do atual aeroporto está próxima da capacidade máxima, coloca-se a questão: qual será a consequência para as receitas do concessionário, a Vinci?

“A concessionária é paga pelo número de passageiros e é um volume de passageiros relativamente importante. Acho que isso teve relevância na hora de tomar a decisão de anular os projetos de alta velocidade [em 2011]”, garante Acácio Pires, membro da associação ambiental ZERO. E explica, apontando para a altura de privatização da ANA e os aeroportos nacionais, em 2013, após o cancelamento do projeto TGV do governo de José Sócrates: “Na ótica de quem está a vender um ativo que são os aeroportos nacionais, anular as ligações de alta velocidade valoriza o preço da venda”.

A própria ANA, gestora dos aeroportos e detida pela Vinci Airports, aponta para a ameaça às receitas representada pela entrada em operação da linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid, no seu Relatório Inicial sobre o Novo Aeroporto de Lisboa (NAL), publicado em janeiro de 2025. Considera que “a implementação de uma linha de comboio de alta velocidade entre Lisboa e Porto e entre Lisboa e Madrid” será capaz de “influenciar o potencial de crescimento da mobilidade aérea em Portugal”.

Para 2027, prevê-se um “impacto limitado no tráfego aéreo”, mas tudo deverá mudar a partir de 2034, quando a viagem durar três horas. Nessa altura, a ANA prevê “um forte impacto nos serviços aéreos e na procura”. Apesar de considerar que a integração de Portugal na rede de alta velocidade europeia vai representar “uma concorrência direta” com o avião, a concessionária acredita que também vem “solidificar ainda mais o estatuto de Lisboa como porta de entrada para as viagens europeias e internacionais, reforçando a competitividade do aeroporto”.

Neste relatório, justifica-se a necessidade de construção do novo aeroporto com a estimativa de evolução do número de passageiros, dos atuais 35 milhões, em 2024, para 52 milhões, em 2060.

Recorde-se que para assumir os custos da construção do futuro aeroporto de Lisboa, o grupo francês Vinci quer ver o prazo de concessão das infraestruturas aeroportuárias nacionais prolongado em 25 anos, até 2087.

Na União Europeia, a promoção do transporte ferroviário em detrimento da aviação comercial não é uma meta claramente definida, apenas inferida a partir das metas ambientais definidas para o setor europeu dos transportes.

Para alcançar a neutralidade carbónica até 2050, as metas europeias preveem um corte, até esse ano, de 90% nas emissões com origem no setor dos transportes, devendo alcançar-se a neutralidade carbónica nas viagens em transportes coletivos para distâncias inferiores a 500 quilómetros e duplicando o tráfego ferroviário de alta velocidade.

Tabu “desfeito” e consenso político

“Só em 2021, dez anos depois, foi possível desfazer o tabu e voltar a falar da alta velocidade ferroviária quando eu era adjunto no gabinete do ministro Pedro Nuno Santos”, conta Frederico Francisco.

Frederico Francisco, na estação ferroviária de Entrecampos, em Lisboa. Foto: Frederico Raposo

Em 2022, era apresentada a linha de alta velocidade para ligar Lisboa ao Porto em uma hora e 15 minutos até 2032.

Mas, ainda assim, tudo era feito com cuidado nas palavras. “Na altura, nem sequer nos atrevíamos a chamar-lhe ‘alta velocidade’. Chamávamos-lhe só ‘Nova Linha Porto – Lisboa’. Depois, com o tempo, é que voltámos a falar em alta velocidade”, recorda o ex-secretário de Estado.

O mesmo aconteceu com o troço Évora – Elvas, em fase de conclusão de obra. A obra foi adjudicada em 2019 e foi inicialmente apresentada ao público como uma linha de mercadorias, para aumentar a competitividade no transporte de bens a partir do Porto de Sines. Mas, soube-se depois, trata-se também de um troço de alta velocidade que vai integrar a futura linha Lisboa – Madrid, encontrando-se preparada para velocidades de 250 quilómetros por hora.

Em 2021, Pedro Nuno Santos, anunciava que “a ligação entre Lisboa e Madrid está já a ser construída”.

Frederico Francisco está convencido de que, agora, “o tabu está desfeito”: “Voltou a mudar o partido do governo e o novo governo que está em funções tem assumido o tema como consensual.”

O consenso político em torno da questão parece, por fim, ter sido alcançado, 35 anos após o início da discussão, com governos PS e PSD a concordarem com a importância estratégica da alta velocidade ferroviária.

Em primeiro, com o projeto de alta velocidade que deverá ligar Lisboa ao Porto em uma hora e 15 minutos em 2032 e, por último, com a linha Lisboa – Madrid, que deverá ficar pronta em 2034.


A conclusão do troço de alta velocidade entre Évora e Elvas é apenas uma de várias obras necessárias à conclusão da futura linha, mas permitirá, de imediato, a redução significativa dos tempos de viagem entre Lisboa e Madrid.

Com a abertura deste troço, que deve acontecer entre a segunda metade de 2026 e 2027, torna-se imediatamente possível a criação de um serviço direto entre as duas cidades com um tempo de viagem de cerca de seis horas, retirando três horas ao tempo de viagem atual, facto que a Infraestruturas de Portugal (IP) confirma.

A Mensagem tentou questionar a CP sobre os planos futuros da operadora para a ligação Lisboa – Madrid, incluindo sobre a eventualidade da criação de um serviço direto após a inauguração do troço Évora – Elvas, mas a operadora apenas confirmou encontrar-se “a analisar vários cenários para as diferentes situações”.

Lisboa – Madrid: uma linha num território de baixa de densidade

Outra das razões para a hesitação no investimento na futura linha de alta velocidade Lisboa – Madrid é o território que atravessa. Ao seguir pelo Alto Alentejo e pela província espanhola da Estremadura, a baixa densidade populacional é uma questão. A comunidade autónoma da Estremadura é mesmo a que regista menor densidade populacional de Espanha, com cerca de 26 habitantes por quilómetro quadrado.

Na futura linha, os grandes polos geradores de viagens estão nas duas capitais. No caminho, ficam cidades de tamanho médio – Évora, Badajoz, Mérida, Cáceres e Toledo. À exceção de Badajoz, com cerca de 150 mil habitantes, todas as outras cidades ficam abaixo dos 100 mil habitantes.

É fator de desinteresse comercial na ligação. Frederico Francisco afirma que “em termos de passageiros aéreos tem um milhão e meio, dois milhões de passageiros por ano – o que para uma ligação aérea é muito, mas para uma ligação ferroviária não é assim muito”.

Paisagem da comunidade autónoma da Estremadura, em Espanha, na linha de comboio que liga a Madrid. Foto: Inês Leote

Se, por um lado, “Lisboa e Madrid são duas áreas metropolitanas importantes, o território que está no meio não tem basicamente nada. São cidades que geram talvez algumas dezenas de milhares de passageiros por ano, que não são relevantes. E também por isso esta linha foi inicialmente projetada como uma linha mista, porque as mercadorias eram importantes para ajudar à viabilidade económica da linha”, explica o especialista.

Por comparação, a futura linha de alta velocidade Lisboa – Porto não sofre do mesmo problema. A faixa litoral entre Lisboa e Porto “é um eixo muito denso com uma procura que é superior a 10 milhões de passageiros. Incluindo os destinos intermédios, estamos a falar de 15 a 16 milhões de passageiros por ano.”

Contrariando o rápido investimento espanhol na restante rede ferroviária de alta velocidade, o investimento espanhol na comunidade autónoma da Estremadura tem sido mais lento. Apesar de contar já com alguns troços da futura linha concluídos, como entre Toledo e Madrid e, mais a sul, entre Badajoz e Plasencia, há obra por fazer do lado espanhol, que prevê concluir o seu lado da linha até 2030.

Comissão Europeia garante linha TGV em operação em 2030, mas Portugal só termina obras quatro anos depois

A linha de alta velocidade entre Lisboa e Madrid deverá ser inaugurada até 2030, mas só estará totalmente concretizada em 2034.

A Comissão Europeia publicou hoje a decisão de implementação relativa à ligação de alta velocidade entre as duas capitais, assinada pelo comissário europeu com a pasta do Transporte Sustentável e Turismo, Apóstolos Tzitzikóstas. Esta decisão, que marca o acordo entre governos de Portugal, Espanha e Comissão Europeia, vem definir metas intercalares até à conclusão final do projeto.

Assim, a linha deverá garantir tempos de viagem entre Lisboa e Madrid de “aproximadamente cinco horas, o mais tardar até 2030” – duas horas de Lisboa até à fronteira e, daí, três horas até Madrid, faz notar o texto da Comissão. Até 2034, com a conclusão de todas as obras em falta, incluindo a Terceira Travessia do Tejo, o tempo de viagem será de cerca de três horas.

Comboio da Renfe, na estação de Badajoz, junto à fronteira com Portugal. Foto: Inês Leote

Em respostas enviadas à Mensagem, a Infraestruturas de Portugal mostra-se alinhada com as metas europeias e aponta para o estabelecimento de serviços ferroviários diretos entre Lisboa e Madrid de cinco horas até 2030 e três horas até 2034. Questionado, o ministério das Infraestruturas e Habitação não respondeu.

No texto da decisão de implementação da ligação, a Comissão Europeia menciona a “complexidade” do projeto, realçando que “todos os componentes da infraestrutura para a ligação são essenciais para garantir um tempo de viagem adequado para os serviços diretos de alta velocidade de aproximadamente três horas”.

Entre estes, contam-se os troços Lisboa – Évora, Évora – Caia, Caia – Badajoz, Badajoz – Talayuela e Talayuela – Madrid. O elemento em falta que apresenta mais complexidade será a concretização da Terceira Travessia do Tejo, prevista para 2034.

O faseamento das obras definido pela Comissão Europeia prevê a seguinte calendarização:

  • Finalização da construção do troço Évora – Elvas até ao final de 2025 e entrada em funcionamento até “meados de 2026”;
  • Entrada em funcionamento do troço Plasencia – Talayuela até ao final de 2028;
  • Construção e entrada em funcionamento do troço Talayuela – Madrid até 2030;
  • Conclusão dos estudos para o troço Lisboa – Évora até final de 2027;
  • Conclusão do troço Lisboa – Évora, incluindo a Terceira Travessia do Tejo até 2034.

O texto da Comissão Europeia sublinha o compromisso espanhol de finalizar todos os seus troços até 2030, mas reconhece a existência de “limitações técnicas e financeiras” do lado português, alargando deste lado da fronteira o prazo de conclusão de todas as obras até 2034.

Em resposta enviada no âmbito deste artigo, a Comissão Europeia revela que em 2026 o coordenador europeu para o Corredor Atlântico, François Bausch, “vai apresentar um plano de trabalho, identificando os maiores pontos de estrangulamento e ligações em falta” no projeto da linha Lisboa – Madrid, atualizando em 2027 a decisão de implementação da linha.

Ainda por conhecer está o financiamento dos projetos em falta do lado português, mas a Comissão Europeia, em resposta enviada no âmbito deste artigo, lembra que propôs duplicar o valor do fundo europeu para o financiamento de infraestruturas, o Connecting Europe Facility (CEF), para cerca de 51,5 mil milhões de euros para o período 2028-2034.

O troço Évora – Elvas beneficiou de 235 milhões de euros de financiamento europeu, ao abrigo do Connecting Europe Facility. Do lado espanhol da linha, o financiamento europeu situa-se em torno dos mil milhões de euros.

Viagem para Madrid “gradualmente” mais rápida, até 2034

2026: seis horas de viagem
2030: cinco horas de viagem
2034: três horas de viagem

Frederico Francisco propõe o reenquadrar da discussão em torno da futura linha de alta velocidade. “A discussão tende a ser feita numa base de tudo ou nada. Parece que só podemos passar disto para ter um comboio que demore menos de três horas”. Mas explica que, tal como indica a Comissão Europeia e a IP, há, até 2034, espaço para se estabelecer um serviço direto entre as duas cidades, com ganhos incrementais, ano a ano.

Assim que a ligação puder realizar-se em seis horas, com a inauguração do troço Évora – Elvas, o deputado acredita que a procura possa aumentar de forma a ser “compatível com a existência de dois ou três comboios por dia, por sentido”. Não sendo suficiente para acabar com os voos entre Lisboa e Madrid, “seria suficiente para ser competitivo com a rodovia e para que algumas pessoas que viajam de avião pudessem escolher viajar de comboio”.

Depois, até 2034, “pode ir-se evoluindo gradualmente até ao objetivo final, que é ter uma ligação que possa competir com o avião e permita acabar com as ligações aéreas”.

Estação ferroviária de Atocha, em Madrid. Era aqui que, até 2020, chegava o Lusitânia Comboio Hotel, vindo de Lisboa. Foto: Inês Leote

A partir do momento em que o troço Évora – Elvas seja inaugurado, algo que na opinião dos especialistas deverá acontecer entre 2026 e 2027, deverá ser inaugurado um novo serviço direto. Carlos Cipriano duvida. Não vê as relações entre os dois países “suficientemente aliadas” e prevê a necessidade de “transbordo na fronteira”, com um possível prolongamento do serviço “Intercidades de Évora a Badajoz e, depois, uma mudança para um comboio de Badajoz a Madrid”.

Acácio Pires, da associação ambiental ZERO, aponta para a próxima Cimeira Luso-Espanhola, a realizar-se na cidade espanhola de Huelva, em novembro, como ocasião para Portugal e Espanha chegarem “a um acordo para a operação, tanto diurna como noturna”.

A ZERO, a que pertence, é membro portuguesa da Aliança Ibérica pela Ferrovia, organização que em outubro de 2024 defendeu a criação de dois serviços ferroviários diários, por sentido, entre Lisboa e Madrid.

Em 2030, o Campeonato do Mundo de futebol, com jogos em Lisboa e Madrid, afigura-se como uma nova oportunidade para a promoção do transporte ferroviário entre as duas cidades. Acácio Pires explica que a Aliança Ibérica pela Ferrovia apresentou a proposta “Um Mundial pelo Clima”, sugerindo a criação de “bilhetes verdes” para os jogos, que incluiriam transporte ferroviário e outros transportes públicos entre cidades que acolhem a competição.

Espanha desconfia de Portugal?

Do lado espanhol, tudo estará pronto a tempo na linha de alta velocidade, “de certeza absoluta”, afirma o especialista em ferrovia Manuel Tão. As dúvidas, considera, situam-se do lado português. O problema “mais complicado”, diz, será mesmo a Terceira Travessia do Tejo. “Não acredito que esteja resolvido em 2034”.

A nova travessia do Tejo é uma obra essencial para o futuro aeroporto de Lisboa, para a mobilidade urbana entre Lisboa e os concelhos a sul do Tejo, mas também para a ligação da capital portuguesa a Madrid. Apesar de prever-se oficialmente a sua conclusão em 2034, permanecem dúvidas sobre a capacidade de executar esta infraestrutura nos prazos definidos, o que colocaria em causa o calendário definido pela Comissão Europeia para a entrada em funcionamento de todos os troços da linha de alta velocidade.

Numa notícia publicada pela rádio espanhola Onda Cero, o governo espanhol reafirmou o seu compromisso absoluto com a linha Lisboa – Madrid até 2030, mas levantou dúvidas quanto à capacidade de cumprimento dos prazos do lado português.

Por ocasião do IX Fórum do Corredor Ibérico Sudoeste, realizado em Madrid, o comissário do governo espanhol para o Corredor Atlântico, José Antonio Sebástian, não hesitou em questionar o compromisso português com a alta velocidade. Ao mesmo tempo que considerou tratar-se de uma “prioridade” para os dois governos, levantou a dúvida: “ou assim queremos entender”, referindo-se à demora no lançamento dos concursos públicos para os estudos e execução dos traçados em falta em Portugal. “Para bom entendedor, meia palavra basta”, concluiu.


*Nota de edição 30 de outubro, 15h45
Acrescentada menção ao comunicado entretanto lançado pelo Ministério das Infraestruturas e Habitação, confirmando a ligação ferroviária a Madrid, bem como as metas intercalares mencionadas.


Frederico Raposo

Nasceu em Lisboa, há 32 anos, mas sempre fez a sua vida à porta da cidade. Raramente lá entrava. Foi quando iniciou a faculdade que começou a viver Lisboa. É uma cidade ainda por concretizar. Mais ou menos como as outras. Sustentável, progressista, com espaço e oportunidade para todas as pessoas – são ideias que moldam o seu passo pelas ruas. A forma como se desloca – quase sempre de bicicleta –, o uso que dá aos espaços, o jornalismo que produz.

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